Levantar a voz em defesa da vida é uma obrigação moral e cidadã de todos. Calar significa agir de modo conivente com os processos que estão ameaçando a vida humana, em diferentes etapas e circunstâncias. E as consequências são graves. Não poupam ninguém, nem mesmo os que se acham seguros porque possuem bens, vivem com conforto e residem em lugares bem vigiados. Os descompassos que ameaçam a vida, dom sagrado, conduzem toda a sociedade rumo a cenários de dizimação. Basta olhar o mundo atual para reconhecer os muitos contextos desse tipo – verdadeiras feridas em diferentes civilizações.
É espantoso ver, por exemplo, o renascimento e o fortalecimento de certas dinâmicas ditatoriais, que sufocam populações com perspectivas desconexas de um sentido pleno a respeito do que é viver. Verifica-se, como consequência, o recrudescimento de entendimentos político-partidários. Consolidam-se totalitarismos e radicalismos que ofendem, vergonhosamente, a dignidade do ser humano. Nações são submetidas ao horizonte estreito de falsos líderes políticos. Tudo em razão do descompromisso com a vida, que alimenta uma egoísta convicção: o importante é o interesse pessoal, desconsiderando que o outro merece respeito. Essa situação explica também a razão de não haver, na sociedade brasileira, uma reforma política, capaz de gerar a renovação e a recuperação da credibilidade nas instâncias do poder.
Quando não se assume a tarefa de defender e promover a vida, navega-se, mais facilmente, na mediocridade, contentando-se, por exemplo, com representantes que nada têm a oferecer. São pessoas incapazes de propor soluções ou promover as transformações requeridas pelo mundo contemporâneo. E uma das consequências é a endêmica prática da corrupção na sociedade brasileira. Outro desdobramento que pode ser destacado é o fenômeno de se escolher a mediocridade menos incômoda. Essa situação apenas beneficia pessoas que buscam o poder, mesmo sendo incapazes de gerar as mudanças esperadas. Assim, conseguem alcançar certo patamar sem muito esforço. Quem se deixa orientar pela mediocridade – aquela que menos incomoda – não raramente dedica-se, por exemplo, a apoiar os radicais – sempre distantes da dinâmica dialógica imprescindível na sociedade. Apegam-se às mentalidades retrógadas, admiram “caçadores de bruxas”.
A presença de indivíduos em postos de decisão, nas mais variadas instâncias, que só buscam benesses e ancoram-se no comodismo é outra consequência daqueles que nunca valorizam o ser humano. Deixam, assim, de reconhecer que estar a serviço dos outros é o único sentido do poder que se exerce. Urgente é, pois, recuperar a competência humanística capaz de qualificar as diferentes formas de se exercer a cidadania. O ponto de partida é reconhecer que o ser humano tem uma vida que ultrapassa a sua existência terrena. Para isso, vozes precisam ecoar, corajosamente, de muitos modos – nas ruas ou no ambiente digital, em contextos educativos e no exigente testemunho da fé, anunciando que viver é dom sagrado e inviolável.
Esse clamor pró-vida há de chegar às urgentes intervenções e reconfigurações das dinâmicas sociais, políticas e econômicas. Deve-se reconhecer que a vida precisa ser respeitada em todas as suas etapas – da fecundação à morte com o declínio natural. Isto significa, entre outros aspectos, compreender como abominável e demolidora a cultura pró-aborto, que se espalha na sociedade brasileira. O desrespeito ao nascituro é lamentável sintoma da perda do apreço em relação à vida. É um verdadeiro abismo, de onde a sociedade brasileira se aproxima quando passa a ser mais permissiva com certas “legislações abortistas”.
Uma sociedade pró-aborto relativiza o valor intocável e inviolável da vida. E o caminho longo da recomposição do tecido social – com a conquista de equilíbrio, equidade e justiça – é justamente a direção oposta: comprometer-se com a vida, em todas as suas etapas. O atual momento pede atitudes diversas, nos mais variados lugares, com a organização de manifestações pacíficas, simpósios e outras atividades formativas, para que se consolide o entendimento a respeito do significado da vida. Pessoas, grupos e segmentos levantem as vozes pró-vida. Assim será possível reacender a esperança de um tempo novo.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Quando Moisés desceu da montanha com a tábua dos 10 mandamentos trazia um ensinamento que serviria de alerta contra as fake news: “não levantarás falso testemunho”. Mesmo que na época a velocidade da comunicação fosse incomparavelmente inferior à dos tempos atuais, a atitude por lá parecia incômoda. A mentira, bem contada, com certas doses de verdade, pode convencer.
Se eu enxergasse a realidade sob a mesma ótica de minha mãe, certamente nem vivo estaria. Ela, 74 anos, viúva, companheira da solidão dos dias e da televisão, se acostumou a ver o mundo através de telejornal. Em sua mente ronda o pavor das cidades grandes, cheias de roubos, assassinatos, desastres etc. Que sorte tem minha mãe: ela não acessa a internet.
Até 2025, de acordo com dados do IBGE, 31,8 milhões de pessoas com mais de 60 anos deverão ter acesso à rede. Por enquanto, minha mãe sequer tomou conhecimento do grupo dos 130 milhões de usuários de whatsapp e do outro de 130 milhões, no Facebook.
A internet, além de instrumento de diversão, com o tempo ganhou o potencial de colocar em risco a vida das pessoas. Foi assim com Fabiane Maria de Jesus, que morreu em 2014 espancada, após ser confundida, através do Facebook, com uma sequestradora de crianças.
Há pouco tempo circulava pela rede o cancelamento da bíblia pelo Papa Francisco. A fake news sugeria a repaginação de outra: “Papa Francisco surpreendeu o mundo hoje ao anunciar que a Bíblia está totalmente desatualizada e precisa de uma mudança radical, por isso a Bíblia é oficialmente cancelada e é anunciada uma reunião entre as personalidades mais altas da igreja onde (sic) será decidido o livro que a substituirá”.
E deram até sugestão de nome: “Bíblia 2000”. O texto trazia o argumento de que a mudança vinha da exigência dos novos tempos: substituir a formalidade da escrita e a constante perda de seguidores da Igreja. Ao final, concluía que a “notícia” havia caído “como uma bomba entre os mais conservadores”. O convencimento de fake news, em geral, faz uso da ideia de abalar psicologicamente o receptor ao gerar pânico, medo, raiva, entre outros sentimentos.
Na ainda recente greve dos caminhoneiros, se pôde observar muitos deles. A fúria da paralisação organizada via Whatsapp deixou governo, motoristas e população em completo alvoroço. Não se sabia em quem confiar.
No tráfego cotidiano de notícias, as fake news saíram do acostamento e trafegaram livremente por vias mentirosas: intervenção militar baseada em pronunciamento de supostos militares graduados, deslocamento de tropas, destruição de veículos etc. Pelo Youtube, um indivíduo anunciava até congelamento de contas bancárias pelo governo. A implantação do caos nas entrelinhas revelava interesses (ocultos) pelo poder.
Se por um lado a interatividade do meio liberta do cativeiro opiniões criativas, por outro, evidencia a força da mídia na construção do estereótipo de uma vida baseada em ideias tolas. O mundo da falsa informação é construído de fantasias, como que aparentemente imaginadas em mesa de botequim: profecias apocalípticas, golpes de estado, pena de morte etc. Os principais criadores de fake news investem na ingenuidade, na fraca formação cultural, na falta de conhecimento.
A velocidade da internet acelera o coro dos “especialistas” de qualquer assunto. No ano passado, o Facebook tomou a iniciativa de alterar o algoritmo a fim de checar o envio automático de publicações suspeitas. A empresa criou até botão de contexto junto às postagens, assim, o usuário saberá da reputação do veículo noticioso.
A evolução dos tempos trará novas ferramentas de comunicação e interatividade, mas dificilmente impedirá a prática imoral tanto de quem cria a falsa notícia quanto de quem a compartilha. Ao passar adiante uma falsa informação, o divulgador, mesmo sem a intenção de prejudicar, expõe sua personalidade a quem lê.
No tempo de Jesus circulou a notícia de que Ele não havia ressuscitado. Tentou-se fazer correr à boca pequena a notícia de que os discípulos haviam roubado o corpo do messias. E a procissão dos fazedores de notícia falsa em procura de autossatisfação prossegue.
Ao longo de mais de dois mil anos, pouco se percebe de evolução na personalidade humana no que se refere ao oitavo mandamento, agora, aliás, em versão digital. Para evitá-lo, basta recorrer ao silêncio. Já disse Jesus: “o que contamina a pessoa não é o que entra na sua boca, mas o que sai por ela” (Mt 15,11).
Pedro Teixeira, repórter do telejornal Canção Nova Notícias.
“A amizade sincera
É um santo remédio, é um abrigo seguro
É natural da amizade
O abraço, o aperto de mão, o sorriso
Por isso, se for preciso
Conte comigo, amigo, disponha
Lembre-se sempre que, mesmo modesta
Minha casa será sempre sua
Amigo
Os verdadeiros amigos
Do peito, de fé, os melhores amigos
Não trazem dentro da boca
Palavras fingidas ou falsas histórias
Sabem entender o silêncio
E manter a presença mesmo quando ausentes
Por isso mesmo, apesar de tão raros
Não há nada melhor do que um grande
Amigo, amigo, amigo.
Por isso, se for preciso
Conte comigo, amigo, disponha
Lembre-se sempre que, mesmo modesta
Minha casa será sempre sua
Amigo “. ( Renato Teixeira)
Dia 20 de julho é o dia do Amigo e dia internacional da amizade. Ela é cantada em prosa e verso e necessária de ser vivida, apesar de todos os desafios que uma amizade pode conter. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira descreve amizade como um Substantivo feminino. Sentimento fiel de afeição, estima ou ternura entre pessoas que em geral não são parentes nem amantes; apreço.
A Bíblia e seus evangelhos nos dizem muito sobre a amizade. O Evangelho de João é considerado o Evangelho espiritual que procura promover a amizade com Jesus (Jo 15,12-17). O evangelista mostra em seu livro que Jesus é um como Deus (Jo 10,30). Sua palavra é a ” Palavra de Deus” (Jo, 14,10). Sua obra é a “obra de Deus”(Jo 5,36). Nele podemos ver quem é Deus (Jo14,25) e quem é o ser humano(Jo 19,5).
Jesus afirmou o seguinte sobre a amizade:
“Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando. Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer” (João 15,13-15). Jesus é o exemplo puro de um verdadeiro amigo, pois Ele deu a sua vida por seus “amigos”.
Provérbios é uma outra boa fonte de sabedoria a respeito de amigos. “Em todo tempo ama o amigo, e na angústia se faz o irmão” (Provérbios 17,17). “O homem que tem muitos amigos sai perdendo; mas há amigo mais chegado do que um irmão” (Provérbios 18,24).
“Leais são as feridas feitas pelo que ama, porém os beijos de quem odeia são enganosos” (Provérbios 27,6). “Como o ferro com o ferro se afia, assim, o homem, ao seu amigo” (Provérbios 27,17).
Estudos mostram que pessoas com mais amigos vivem mais. Ter boas companhias também ajuda a combater depressão.
“No geral, o papel da amizade em nossas vidas não é terrivelmente bem apreciado”, disse Rebecca G. Adams, professora de sociologia da Universidade da Carolina do Sul, em Greensboro. “Há várias expectativas em famílias e no casamento, mas muito pouco na amizade. A amizade tem um impacto mais forte em nosso bem-estar psicológico do que as relações familiares”.
Procure ter boas amizades, bons amigos e o melhor de todos. Leia , acredite, siga e pratique o que o melhor amigo nos ensinou: Não façamos aos outros aquilo que não queremos que façam conosco . Feliz amizade, feliz dia de amigos.
Regina Coele Barroso Queiroz Santos
Catequista-butibarroso@yahoo.com.br-
Sabinópolis
A onda apaixonante do esporte, particularmente do futebol, permite metáforas interessantes para inspirar o país a trilhar novo caminho e a alcançar o almejado patamar de nação campeã. A luta pelo título mundial ocorreu em campo e os resultados obtidos pouco mudaram o cotidiano abastado de uma minoria, que inclui os atletas. Mas a frustração da derrota mexe com os brios e as emoções de uma avalanche de cidadãos. É preciso assimilar a perda na competição esportiva e valorizar mais o que realmente impacta a vida de muitos. Obviamente, há lugar para a paixão esportiva sempre. Mas o sentimento que o futebol desperta não deve ocupar o lugar de todas as razões e emoções que são necessárias para promover transformações profundas na realidade. Perdido o título, fica a pergunta: e agora, qual o é o “hexa” a ser conquistado?
Parece que, nesta Copa do Mundo, a paixão esportiva foi vivida de modo mais saudável. Reflexo disso é que a derrota da seleção brasileira não gerou um clima de “fim de mundo”. E a esperança é que a perda dentro de campo seja oportunidade para o aprendizado de lições que, se bem assimiladas, podem levar a vitórias importantes, inclusive no âmbito esportivo. Ao observar o que não deu certo, é possível construir novos projetos, a serem regidos por pessoas comprometidas com o qualificado exercício da cidadania. E o primeiro passo é ter consciência da realidade.
Há sinais de que o povo começa a desenvolver essa consciência. Um dos exemplos: a forma reduzida com que as pessoas manifestaram seu entusiasmo com a Copa deste ano e a timidez da decoração nas ruas e praças. Afinal, diante das fragilidades do contexto social, não há espaço para euforia. A esperança é que cada vez mais pessoas cultivem uma certeza: o que mais conta agora é vencer os desafios e processos que estão corroendo a nação brasileira, e avançar em direções que permitam reconstruir o país. Isso significa superar os cenários vergonhosos das misérias, corrupção, agressão irracional do meio ambiente e tantos outros males que refletem certo descompromisso com o exercício da cidadania.
Ganhar a Copa do Mundo é um sonho, motivo de festa, mas esse objetivo está longe de ser o mais importante na vida de uma nação. Inclusive porque, equivocadamente, o futebol torna-se, gradativamente, apenas um negócio, fonte de lucro para pequenos grupos que acumulam muito dinheiro e privilégios. O esporte, ao invés disso, deveria ser promovido a partir de sua força educativa, capaz de reconfigurar o tecido cultural da sociedade, qualificando as pessoas para construírem um futuro melhor. Assim, em vez de almejar o “hexa” na Copa, o povo poderia eleger novas prioridades, a partir do respeito ao bem comum.
As prioridades que precisam ser assumidas são muitas, incontáveis, percebidas a partir das diversas carências do país. Para reconhecer o “hexa” a ser conquistado é preciso se questionar a respeito do Brasil que se quer construir. No centro da resposta, certamente, não estará a celebração de uma festa passageira. Em vez disso, as prioridades são a recomposição indispensável dos parâmetros éticos que devem nortear a conduta de cada pessoa, a promoção da solidariedade e da honestidade, forças capazes de impulsionar um recomeço para o Brasil.
Esse reinício é o verdadeiro caminho rumo às vitórias capazes de superar a violência, a exclusão social e a ganância sem limites que passa por cima de tudo, destruindo o planeta, a casa comum. Cada brasileiro é convocado a sonhar com um país melhor e, a partir disso, agir. Afinal, muitas situações precisam ser reconfiguradas. É urgente, por exemplo, construir um novo modo de se fazer política, livre de interesses egoístas, e zelar para que as ações no poder judiciário sejam, de fato, orientadas pelos parâmetros da verdade e da justiça.
A lista de prioridades para que seja possível construir uma nação campeã é grande e demanda especial empenho de todos. Para efetivar o sonho de construir um país renovado, vale investir todas as emoções e razões, “correr” velozmente. Ao invés de se apegar às paixões passageiras, todos assumam a tarefa cidadã de responder ao seguinte questionamento: e agora, qual é o “hexa”?
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
O coração humano foi feito para a alegria, que gera força, fecunda a criatividade e é fonte perene de humanização. Há, pois, uma permanente e legítima busca pela felicidade. Mas, no contexto atual, muitas pessoas, valendo-se da liberdade e da autonomia, tomam rumos que levam às satisfações efêmeras, distanciando-se da verdadeira alegria, que é permanente. Corre-se, assim, o risco de apegar-se ao que é efêmero, por falta de capacidade para discernir bem. Um drama existencial que conduz muitos a experimentarem sensações agradáveis, mas que são fugazes, alcançadas a partir de futilidades e da indiferença em relação às outras pessoas. Essa atitude egoísta configura um ciclo perverso, viciante, em que é alimentada a necessidade de experimentar, a qualquer preço, alegrias efêmeras para ocupar um vazio na interioridade, nunca plenamente preenchido.
Esse fenômeno existencial incide na vida de muitas pessoas, influenciando fortemente as dinâmicas sociais. Cria-se, assim, um campo fértil para manipulações, descompromisso com a solidariedade, disputa predatória, esquemas de corrupção. Na raiz desses problemas está a equivocada convicção de que o poder e as posses são garantias de felicidade duradoura. Uma crença muito comum, que mostra bem como a cultura de um povo é determinante para a sociedade tornar-se capaz, ou não, de conquistar a verdadeira alegria. Certamente é bem mais feliz um povo que consegue perceber a alegria como algo diferente de certas sensações – euforias e sentimentos passageiros, conquistados a partir de atitudes que muitas vezes desrespeitam os parâmetros da ética. Uma sociedade com essa capacidade de discernimento alcança equilíbrio em diferentes campos, a exemplo da política e da economia, pois as alegrias duradouras se propagam, geram ecos.
Já a satisfação efêmera não sacia o coração humano de sua sede de sentido. Cada alegria passageira, quando se esvai, deixa uma lacuna interior que contribui para desajustar a vida humana, impactando negativamente os humores e as razões. Esse vazio existencial evidencia algo urgente: é preciso aprender a buscar a felicidade duradoura, dedicar-se a um processo de aprendizagem para conquistar, progressivamente, envergadura humana e espiritual. Assim será possível reconhecer, por exemplo, que a vitória em uma partida de futebol não é alegria duradoura, e a derrota também não é “o fim do mundo”, porque existem coisas mais determinantes e razões maiores que definem o futuro de uma pessoa ou do próprio povo.
A existência humana é uma construção. Tem seus altos e baixos, as sombras e as luzes, mas deve ser sempre uma busca pelo que confere sentido e sustenta a vida: as alegrias verdadeiras que geram ecos, desdobrando-se em diferentes tempos e lugares. Na procura pela autêntica felicidade, vale recordar uma lição de São Francisco de Assis. Certo dia, em diálogo com Frei Leão, São Francisco explicou que a verdadeira alegria não reside em certos acontecimentos, aparentemente grandiosos, mas na qualidade de cultivar a paciência e de não se perturbar diante das adversidades da vida. A autêntica alegria, que produz ecos, desdobramentos, não nasce de estímulos meramente externos, da posse de certos bens. É fruto da interioridade, da capacidade de enxergar, com clareza, uma hierarquia de virtudes e ações.
Para se conquistar essa clarividência e experimentar a verdadeira felicidade, há uma fonte referencial que é imprescindível: o Evangelho de Jesus Cristo, que aponta caminhos e recomenda práticas capazes de fazer com que cada pessoa seja fonte de alegria duradoura. A Palavra de Deus tem força para corrigir os descompassos da sociedade contemporânea, em que muitos, alucinadamente, buscam alegrias efêmeras, exatamente por falta de envergadura interior. E um itinerário educativo que contribui para levar os ensinamentos do Evangelho à vida cotidiana está delineado na Exortação Apostólica Alegria do Evangelho, do Papa Francisco.
Dentre as muitas indicações da Exortação Apostólica estão a busca pela superação de um modelo econômico que gera exclusão, o combate à idolatria do dinheiro – que nega a primazia do ser humano – e o reconhecimento de que o trabalho é fundamental para a realização da pessoa. Particularmente, o Papa Francisco alerta que é preciso vencer a desigualdade social que alimenta a violência. Afinal, a miséria de muitos é sinal de que tantos outros procuram, de modo equivocado, a alegria, acumulando quase tudo para si, o que faz crescer uma grande massa de excluídos. Eis, pois, um desafio existencial a ser assumido por todos, com desdobramentos na vida social: à luz do Evangelho, reconhecer o primado da ética na busca pela verdadeira felicidade – a alegria duradoura, que gera ecos.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
No Estado de Minas Gerais, crianças e adolescentes estão sem aulas desde março. Servidores estaduais têm o salário parcelado em 3 vezes. Desde 2016, recebem os provimentos com atraso. Muitas famílias sofrem os efeitos da instabilidade política.
Em maio, a greve dos caminhoneiros parou o país por mais de 10 dias. Nas cidades, os cidadãos já não conseguiam comprar produtos básicos para a economia doméstica. Faltaram alimentos, gás de cozinha, remédios nas farmácias.
O preço dos produtos aumentou. A conta de energia elétrica está mais cara. Cresce o índice de desemprego no país. 13 milhões de trabalhadores estão sem trabalho. Aumentam a informalidade, a violência e a desigualdade social.
Pesquisa divulgada pelo jornal Folha de São Paulo mostra que 70 milhões de brasileiros, com 16 anos ou mais, deixariam o país se pudessem. Os níveis de descrédito são altos. Pouca gente acredita em novos rumos, na política e na economia, para a sociedade. Ética, infelizmente, virou uma palavra fora de moda. Vale tudo para manter o poder. Tudo.
Empresas multimilionárias mantêm salários astronômicos dos jogadores de futebol. Famílias trocam os televisores nas lojas para assistirem aos jogos da Copa do Mundo. As narrativas sobre a vitória da seleção canarinho prevalecem na propaganda dos meios de comunicação. Quando vencem os comandados do Tite, o povo brasileiro vence! Muitos cidadãos não creem nisso mais.
O mês de julho chegou! Você se lembra, leitor/a, da magia desse período do ano? Férias, famílias reunidas, sinais de solidariedade em mínimas atitudes cotidianas. Não sei se devo afirmar, mas julgo vivermos em tempos de desafetos. Não sabemos quando começa nem quando termina essa passagem.
Esperança, justiça, paz, amor, solidariedade, respeito mútuo, enfim, valores dos quais a sociedade tanto precisa têm de ser cultivados por todas as pessoas. A mensagem de Lucas constitui um desafio ao nosso entendimento e à prática da virtude: “(…) o Reino de Deus está entre vocês” (Lc 17,21).
Luís Carlos Pinto
Professor de Educação Básica
O universo da internet e suas consequências ainda são uma novidade para o mundo e, sobretudo, para a Igreja. Sendo a internet fruto da inteligência humana criada por Deus, ela está também no plano do Criador.
Talvez a internet seja a mais revolucionária das atuais invenções humanas. Os desdobramentos na vida prática e na mentalidade das pessoas são inimagináveis. Provavelmente, quase tudo irá funcionar através dela.
A meu ver, um dos principais efeitos positivos da internet é nos tornar mais humildes. O nosso orgulho intelectual desaparece e ficamos humilhados diante da simples página de busca do Google. Desapareceu a pessoa considerada uma “intelectual-enciclopédia”. Daqui para frente o homem vai ter que começar a pensar profundamente sobre aquelas coisas que o Google não consegue responder. Creio que a internet fará o homem voltar-se para a busca do essencial, cansado da enxurrada de informações úteis e inúteis que, na maioria das vezes, só o leva à curiosidade ou mesmo à perda de tempo. Daí o tempo parecer passar velozmente, a velhice chegar mais rápida, a morte mais próxima; e o ser humano cada vez mais ansioso e deprimido.
Outra virtude da internet é acabar com a hipocrisia dos relacionamentos sociais. A internet está purificando as amizades reais que, de fato, são poucas. Um pesquisador afirmou que nos interessam somente três ou quatro contatos (“amigos”) que estão nas redes sociais. Os contatos on-line são semelhantes às pessoas conhecidas que cruzamos na calçada e fazem de conta que não nos viram.
A internet será cada vez mais um instrumento maravilhoso do ser humano e provocará na Igreja constante conversão pastoral. Contudo, alguns valores como a fé em Deus, a família, o amor, são tão infinitos, que jamais caberão nas pequenas telas digitais. Para a Igreja o mais importante será sempre o ser humano e não os maravilhosos aparelhos com inúmeras utilidades, que são simplesmente instrumentos que devem ajudar a humanidade a ser cada dia melhor. Enfim, estar conectados é uma coisa, mas estar unidos em fraternidade é outra coisa.
Paradoxalmente, alguns pesquisadores estão afirmando que as redes sociais acentuam a depressão nos seus usuários. A falsa sensação de estar conectado mascara o exacerbado individualismo e egoísmo. O problema da ser humano não é a solidão, o problema é o vazio da alma. Muitos confundem solidão com vazio interior. A solidão é inerente à condição humana. Todos temos no profundo da alma uma região que nada, nem ninguém consegue entrar, nem nós mesmos, somente Deus. Experimentamos a solidão, pelo menos em duas ocasiões, na dor profunda (diante da realidade da morte, por exemplo), e quando temos que tomar uma decisão muito importante que somente nós podemos tomá-la.
Quem tem fé sabe que não está jamais sozinho, mas será sempre habitado por uma “Presença”, misteriosa sim, mas, tremendamente real e envolvente. Quem tem fé sente-se envolvido por uma inexplicável presença amorosa e, portanto, não sentirá solidão. Quem não tem fé, mesmo estando rodeado de muitas pessoas, sente-se sozinha e, geralmente, vive cobrando das pessoas ao seu redor mais atenção e mais afeto.
Muitos querem ilusoriamente preencher o vazio da alma com bens materiais: são as pessoas consumistas; os carreiristas e orgulhosos querem se preencher de poder e cargos ondem possam exibir seu Ego inflado; outros buscam o prazer desenfreado do álcool, drogas, sexo; alguns tentam se preencher com coisas mais nobres: matam-se de trabalhar (workaholics = viciados em trabalho!), outros com malucas filosofias, seitas, ideologias.
Enfim, o resultado de tudo isso será mais vazio e mais tristeza na alma. Meu irmão e minha irmã, tudo isso tem solução: basta deixar de ser egoísta e preguiçoso e começar a ajudar e dar mais atenção às pessoas que estão ao seu redor. Assim fazendo, milagrosamente a paz, a alegria e a serenidade vão jorrar de dentro do seu coração. Simples assim. Faça o teste.
Dom Frei Rubens Sevilha, OCD
Bispo Diocesano de Bauru
Fonte: http://www.bispadobauru.org.br/dom-rubens-a-solidao-on-line_pb_257
O MUNDO DA POLÍTICA
“Deixemo-nos tocar pelo que nos ensina o Papa Francisco sobre os leigos e a política: ‘Peço a Deus que cresça o número de políticos capazes de entrar num autêntico diálogo que vise efetivamente a sanar as raízes profundas e não a aparência dos males do nosso mundo’”. Ele afirma que “A política, tão denegrida, é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o bem comum”. (Papa Francisco, citado pelo Documento 105 da CNBB, n 258)
Política! Política? Eleitores de três cidades mineiras, cujo prefeito fora cassado, compareceram às urnas para a eleição de seu novo administrador: Guanhães, Ipatinga e Pocrane. Dados mostraram a insatisfação do eleitor quanto ao atual sistema político: em Guanhães e Ipatinga, a abstenção chegou à casa dos 32%; em Pocrane, 24% dos eleitores não compareceram. Votos em branco e nulos atingiram um número não pequeno: Ipatinga, cerca de 23%; Guanhães, 12%; Pocrane, 6,6%.
Alguns candidatos atribuem o resultado ao pouco tempo para campanha, como também ao momento histórico em que a classe de caminhoneiros reivindicava direitos, deixando o país completamente parado, entretanto é notório que o povo está cansado de tantos desmandos, falcatruas e tudo mais. Queremos mudança da sociedade e do mundo, mas não queremos mudar em nós?
Quem “teve paciência” de acompanhar a campanha dos quatro candidatos ao cargo de prefeito de Guanhães, certamente entendeu que todos eles anseiam (presente) “por uma Guanhães melhor”. Dóris Campos Coelho, a Dorinha da Farmácia, e o vice Célio Augusto da Silva, foram eleitos com 40,54% dos votos válidos. Como cristãos – católicos ou evangélicos – , seguidores dos ensinamentos de Jesus Cristo, não seria esta a hora de unir forças para o verdadeiro exercício da democracia?
Padre José Carlos Pereira (2018) sugere que “muitas vezes continuamos com nossos pensamentos tacanhos e com preconceitos absurdos; continuamos com posturas medíocres e com um olhar cada vez mais míope da realidade. Se continuarmos assim, não haverá mudança para melhor, mas para pior”.
Para que haja mudança no mundo, “seja você a mudança que quer ver no mundo”, comece pelas pequenas coisas – em sua casa, em sua cidade -, mas exerça os seus direitos, cumpra seus deveres. Se temos fé e acreditamos que as coisas vão melhorar, ela melhorarão; o contrário também é verdadeiro. O processo de mudança não é algo mágico; exige atenção, vigilância e tomada de decisão/ação. É fácil? Não! Mas é possível e vale a pena!
Outras eleições vêm aí! Por meio da tecnologia, em um clique, sabemos de todo o histórico da vida das pessoas; temos acesso aos dados dos políticos que legislam em causa própria e lesam o país e seu povo. Que a escolha seja consciente e não pautada em interesses pessoais. Que tenhamos sentimento cristão na hora da escolha daqueles que nos representam (?) e joguemos ao fogo o “joio”, separando-o do “trigo”.
“Rezo ao Senhor, para que nos conceda mais políticos que tenham verdadeiramente a peito a sociedade, o povo, a vida dos pobres”. (Papa Francisco, EG,n.205). Assim como o Papa Francisco, rezemos por todos e para todos. Que sejamos o Sal da Terra, a Luz no Mundo e fermento na massa, que é o grande povo de Deus.
Mariza C. Pimenta Dupim – professora.
Os santos mais populares de junho

Em junho, aqui no Brasil, celebramos vários santos, mas destacaremos apenas quatro deles, os mais populares: Santo Antônio de Pádua, ou de Lisboa, celebrado dia 13/06; São João Batista, primo de Jesus, filho do sacerdote Zacarias e de Isabel, que possui duas celebrações na Igreja: dia de seu batismo, celebrado dia 24/06, e dia de seu martírio, celebrado em 29/08: “O maior dos nascidos de mulher” (Lc 7, 28), segundo o próprio Jesus. E, por último, num dia só destacamos São Pedro, primeiro papa, e São Paulo, apóstolo dos gentios, celebrados no dia 29/06, data do martírio deles.
Santo Antônio
Podemos invocar o mesmo santo como Santo Antônio de Lisboa ou Santo Antônio de Pádua, se consideramos a cidade onde ele nasceu (em 1195), ou morreu (em 1221), respectivamente. Recebeu no batismo o nome de Fernando de Bulhões. Vocacionado à missão religiosa, ingressou na Ordem dos Agostinianos. Estudou profundamente as Sagradas Escrituras e a Patrística. Era professor de Bíblia e orador de grande fama. Passou a se chamar Antônio quando entrou para a Ordem dos Frades Menores, ainda no tempo do santo fundador, São Francisco. De saúde frágil, morreu cedo, após intensa vida de pregador e de dedicação aos pobres, o que fez dele um dos santos mais populares da Igreja.
Considerado como o “Santo casamenteiro”, Santo Antônio é parte integrante do catolicismo popular brasileiro. Muitas moças, no imenso desejo de se casar, colocam a imagem do santo de cabeça para baixo, dentro de uma vasilha – incômoda posição – e dizem que só vão desvirá-lo quando conseguirem um marido ou noivo. Sua imagem é dada de presente àqueles que se casam ou a alguém que se pretende ver casado. Vejamos, aqui, alguns versos populares cantados ao santo no interior do nordeste brasileiro:
Para casar:
“Santo Antônio, me case já,
Enquanto sou moça e viva,
Porque milho plantado tarde
Não dá palha nem espiga”.
Depois de casada:
“Santo Antônio pequenino,
Amansador de burro bravo,
Vem amansar minha sogra,
Que é levada do diabo”.
Santo Antônio viveu apenas 36 anos, depois de fazer muito bem aos pobres, e também depois de haver exercido importantes cargos em sua ordem religiosa.
São João Batista
Esse pregador judeu, do início do século I, é mencionado pelos quatro evangelistas, e considerado o “precursor do Messias”. Pode ser considerado o santo mais popular de junho, e de seu nome é que provém o adjetivo “juninas” para as festas do mês, quando se celebravam as novenas, festas e fogueiras “joaninas”. Suas festas, no norte e nordeste de Minas, e subindo-se para o nordeste e norte do Brasil, só se equiparam às festas natalinas.
O nome “João”, que em hebraico significa “Deus é propício”, era e ainda é um nome muito comum. Ele foi apelidado de “Batista” porque batizou muitos judeus no rio Jordão, incluindo o próprio Jesus, e pregava a penitência e a conversão para uma vida mais justa e mais conforme às leis de Deus. Os cristãos usaram o batismo joanino e deram a ele um novo significado, para que marcasse a entrada da pessoa na nova religião iniciada pelo Messias, Jesus de Nazaré.
João Batista levava vida austera, de intensas penitências. Segundo Mateus (3,4), ele trajava vestes de pele de camelo, um cinto de couro, e alimentava-se de gafanhotos – uma espécie de fruto adocicado, também chamado de Pão-de-são-joão ou figueira do Egito – e mel silvestre.
João também possuía discípulos, como Jesus, e os ensinou a orar (Lc 11,1). Como relata o capítulo 11 de Mateus, quando João Batista foi preso, ele enviou dois de seus discípulos até Jesus para que se certificassem de que Jesus era mesmo o Messias. Com essa certeza, o Batista poderia morrer tranquilo, sabendo que estava no mundo aquele a quem anunciara.
São Pedro
Os evangelhos nos dizem que São Pedro era de Betsaida, na Galileia. Era pescador e formava dupla de pesca com seu irmão André, que se tornou também apóstolo de Jesus. Seu primeiro nome era Simão, nome muito comum entre os judeus: Shimon; Shimon bar Jonas (Simão, filho de Jonas ou de João).
Simão, ou Simão Pedro, é citado 182 vezes no Segundo Testamento da Bíblia. Só os evangelistas o citam 113 vezes: Mateus: 24; Marcos: 23; Lucas: 27, e João: 39 vezes. Ele é um personagem espontâneo, de iniciativas rápidas, pensamento ligeiro, por isso toma a iniciativa de muitas respostas que Jesus faz aos Doze.
Pedro, colocado por Jesus como a grande referência do grupo apostólico, compartilha com Saulo de Tarso, o convertido apóstolo Paulo, o centro do livro dos “Atos dos Apóstolos”. Muitas pessoas pensam que esse livro fala de todos os apóstolos de Jesus, mas fala dos grandes esteios da fé, que são Pedro e Paulo. Os outros apóstolos são quase detalhe no livro.
Segundo a tradição cristã, Pedro morreu em Roma, onde foi crucificado, por volta do ano 67 da era cristã. A seu pedido, por se julgar indigno de morrer como seu Mestre e Senhor, foi crucificado de cabeça para baixo.
São Pedro é considerado pela Igreja como o primeiro papa, do qual o papa Francisco é o 266º sucessor.
São Paulo
Nascido na cidade de Tarso, Saulo foi um fervoroso judeu. Recebeu esmerada educação do grande rabino Gamaliel, como nos conta o próprio Saulo, convertido em Paulo (Atos 22,3). Sua conversão se dá quando se dirige a Damasco, capital da Síria, para capturar e prender cristãos. Para isso possuía autorização escrita do sinédrio de Jerusalém. Mas no caminho Jesus lhe aparece, e a história de Saulo passa a ter outro sentido.
São dele várias cartas do Segundo Testamento bíblico. Praticamente, a doutrina presente em seus escritos dá um fortíssimo embasamento à fé cristã, e muito da teologia católica tem nos ensinamentos de Paulo sua estruturação.
Pedro e Paulo representam a figura do Papa: o primeiro representa a Igreja institucional e hierárquica, e necessária; o segundo representa o carisma, a evangelização dos gentios, daqueles que ainda não fazem parte do rebanho. Eles são as duas faces de uma mesma Igreja, cujo corpo é misteriosamente o do próprio Jesus.
Ismar Dias de Matos, professor de Filosofia e Cultura Religiosa na PUC Minas
p.ismar@pucminas.br
Os acontecimentos da vida, que é uma escola, são lições. Por isso, é muito comum ouvir o dito popular “vivendo e aprendendo”. As lições são muitas e o desafio maior é aprendê-las. Só as aprende quem se coloca no lugar de aprendiz. Há quem se arvora em mestre dos outros e perde a capacidade para aprender, pois acredita que já sabe de tudo. Aprende mais quem está disposto a escutar. A incompetência para o aprendizado atinge seu patamar avassalador quando incide no tecido cultural da sociedade, revelando um fenômeno: muitos se julgam na condição de ensinar, e acreditam que não precisam mais aprender.
Consequentemente, há o travamento das dinâmicas que promovem as evoluções na compreensão. Falta lucidez para a solução dos problemas e a sociedade permanece ameaçada pelos extremismos. Nesse contexto, convive-se ainda com desmandos e corrupção. Falta vergonha aos que se permitem usufruir de privilégios, que alimentam exclusões e discriminações. Eis a névoa que confunde as feições e paira sobre a sociedade brasileira, obscurecendo a verdade e tornando a mentira a protagonista da história. Tudo vale para defender interesses particulares, até mesmo ações inconsequentes.
Não deveria ser assim, pois a sociedade brasileira, em seus mais de cinco séculos de história, já deveria ter assimilado muitas lições. Mas a incapacidade para aprender pode explicar o desenvolvimento pífio do país. Se as lições da história fossem aprendidas, a classe política brasileira poderia, agora, ajudar o Brasil a sair do caos dos desencontros e aproveitar melhor as oportunidades deste tempo, valendo-se das riquezas ambientais e culturais da nação. Ao invés disso, vê-se um pavoroso “bate-cabeça” entre os que ocupam os lugares de lideranças sem serem líderes. A consequência é a disseminação de um jeito de ser que contamina também os espaços políticos. A demagogia torna-se a tônica principal, contracenando com a desconfiança e os ataques mútuos.
Os posicionamentos polarizados, quando se transformam em hostilidades, ferem visceralmente o andamento da vida do povo, enfraquecem as indispensáveis alianças, obscurecem os diálogos e instalam o caos. Há uma completa perda do sentido de limite. A insistência nos equívocos e as miopias que impedem enxergar as soluções agravam os problemas e multiplicam os pesos sobre os ombros de todos. Assim, o cidadão se distancia das lições que o possibilitariam ajudar na construção de um país melhor. Passa-se a enxergar apenas a própria causa, a considerar como único e intocável o discurso que se defende. O resultado é a gravíssima perda da sensibilidade para se abrir a uma inadiável dinâmica de conversão, capaz de inspirar atitudes com força de mudanças.
Sem os aprendizados necessários, contenta-se apenas com o conforto institucional do lugar ocupado e seus privilégios – a incapacidade para se colocar no lugar do outro, a quem se deveria servir e ajudar. Para mudar essa postura, devem-se habilitar os olhos para enxergar além dos próprios interesses e comodidades. Admitir que o exercício qualificado da cidadania não pode conviver com os conchavos, os privilégios e a busca por vantagens a partir da corrupção.
A sociedade brasileira clama precisada de um novo ciclo de aprendizagens das muitas lições que estão inseridas em sua história. As instituições e segmentos da sociedade carecem de gestos corajosos para aprender, por meio do diálogo, a cuidar do bem comum a todo custo. A transformação do país, para conseguir sair dos limites perigosos a que chegou, exige de todos um gesto de conversão, bem concreto. É preciso modificar funcionamentos para recuperar a credibilidade perdida, importante para o urgente processo de mudança: um tempo novo para o aprendizado das lições, Brasil!
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte