A Palavra do Bispo
Mensagens e publicações do bispo diocesano, Dom Otacilio Ferreira de Lacerda.
Mensagens e publicações do bispo diocesano, Dom Otacilio Ferreira de Lacerda.

As Diretrizes Gerais da ação evangelizadora no Brasil (2019-2023), Documento nº. 107 da Conferência Nacional do Brasil (CNBB), nos apresentam como Objetivo Geral:
Abençoados por Deus e protegidos por Maria
Senhor, iniciaremos mais um ano, e pedimos todos os dias Vossa bênção e proteção.
Fazei resplandecer sobre nós Vosso rosto, e tenha misericórdia de nós,
Humildemente, em Vossas mãos, colocamos nossa miséria por Vós redimida.
Senhor, volte para nós o Vosso rosto e nos dê a Vossa a verdadeira paz,
A plenitude de todos os dons, enriquecendo-nos imensuravelmente com eles,
Pois valem mais do que todo o ouro e riqueza do mundo inteiro.
Senhor, concedei-nos, a cada dia, um coração contemplativo e meditativo,
Como o coração de Vossa Amantíssima Mãe que,
Contemplando os Mistérios divinos, nos ensinou o mesmo fazer.
Senhor, com este olhar, saibamos silenciar o coração e amar como amais,
Sobretudo quando as águas turbulentas de nossa história se agitarem,
jamais percamos a fé e esperança, porque em Vós não se decepciona quem confia.
Senhor, como aos Vossos pastores, concedei-nos Vosso Santo Espírito,
Para louvar e glorificar a Vossa incansável ação em nosso favor,
Vós que nos cumulais de copiosas graças e infinitas maravilhas.
Senhor, por Vós iluminados e conduzidos pelo Vosso Santo Espírito,
Proclamemos Vossa divina Palavra, como alegres mensageiros
Discípulos missionários, com os pés a caminho, em permanente missão.
Senhor, enfim, nós Vos agradecemos, porque ao Se Encarnar e por nós morrer,
Nos redimistes e Deus nos adotou por filhos, e nos fez herdeiros por Vossa graça,
Herdeiros da mais bela riqueza, hospedeiros do mais belo Hóspede: o Santo Espírito.
Trindade Santa, sejamos, portanto, a cada dia deste ano, abençoados,
E, por Vossa Mãe, no colo carregados, e também amados e protegidos,
Por maiores que as dificuldades sejam, maior seja a força que vem de Vós. Amém.
Em Nazaré, há dois mil anos, existiu uma família que para todo o tempo, para além da cultura, foi, é e será sempre modelo para toda família: A Sagrada Família de Nazaré.
Na Missa do Dia de Natal, celebramos o Mistério da Encarnação numa atitude de serena alegria e de ação de graças por tão maravilhoso acontecimento:
– O Filho eterno do Pai fez-Se homem;
– O Verbo que tudo criou fez-Se carne da nossa carne;
– Aquele que habitava nos Céus pôs a Sua morada no meio de nós;
– A “verdadeira luz” que veio ao mundo, deu a conhecer a Deus “a quem nunca O tinha visto”.
Na passagem da primeira Leitura, proclamamos o oráculo do Profeta Isaías (Is 52, 7-10). Um oráculo em forma de poema, com um lirismo surpreendente:
“Como são belos sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz, que traz a Boa Nova, que proclama a Salvação…” (Is 52.7).
Somos convidados a contemplar a Pessoa do recém-nascido reclinado numa manjedoura, e assim contemplamos a imensurável humildade de um Deus, cuja força se manifesta na fraqueza.
Na passagem da segunda Leitura, ouvimos o início da Epístola aos Hebreus (Hb 1,1-6). Deus, ao contrário dos ídolos mudos, falou conosco e por muito tempo, de modo especial pelos Profetas.
“Nestes tempos, que são os últimos”, enviou a Sua própria Palavra, “imagem do Seu ser divino”, do Seu desígnio, da Sua vontade. Ele mesmo Se faz Palavra e vem ao nosso encontro. Ele, Palavra viva e eficaz (Hb 4,12)
Na proclamação do Evangelho de São João, ouvimos os primeiros versículos (Jo 1,1-18). Com extrema beleza e estilo próprio, o Evangelista, ao mesmo tempo, sóbrio e solene, nos apresenta a Encarnação de Jesus através de um grande hino litúrgico, como que a abertura de uma “Sinfonia do Novo Mundo”.
Enuncia os temas que, logo a seguir, se desenvolverão em múltiplas variações com contrapontos sutis, de modo que o realismo da Encarnação do Filho de Deus constitui o centro desta vigorosa introdução do Evangelho.
A Palavra feita Carne é a revelação do Pai, do Seu amor. Receber, acolher e crer nesta Palavra é ter a vida eterna, como afirma nos capítulos posteriores.
Verdadeiramente assim cremos: Deus, movido por amor, desce misericordiosamente ao nosso encontro, porque havíamos caído miseravelmente, conforme nos falou o Bispo Santo Agostinho.
Agora que celebramos o Mistério desta Presença em nosso meio, urge que sejamos alegres mensageiros do Verbo, num mundo marcado por vezes por realidades sombrias, tristes e de morte.
A Encarnação do Verbo é, ao mesmo tempo, a nossa elevação, porque Ele Se faz hóspede de nossa alma e nos envia para sermos, no mundo, sinal de Sua presença, como alegres discípulos da misericórdia divina, dando razão de nossa esperança, no corajoso testemunho de nossa fé, inflamados pelo fogo do Seu indizível Amor.
Enfim, contemplar a Encarnação e ver a glória de Deus, é viver de modo a favorecer que vejam e sintam a presença de Deus em nós e em todas as pessoas.
PS: Missal Quotidiano, Dominical e Ferial – Ed Paulus – Lisboa – pp.178-180

“Vós sabeis em que tempo estamos, pois já é hora de despertar.
Com efeito, agora a Salvação está mais perto de nós
do que quando abraçamos a fé.” ( Rm 13,11)
No 1º Domingo do Advento do Ano Litúrgico (ano A), somos exortados para uma frutuosa preparação para o Natal:
“O apelo à vigilância, atentos ao Senhor que veio, vem e virá: “Nas Leituras deste primeiro domingo do Ano Litúrgico predominam dois temas: a vinda do Senhor e o tema da Vigilância.
Mais do que dois temas, trata-se antes, de dois ‘movimentos’: O Senhor vem – vamos a Seu encontro; Deus vem ao homem, mas só O encontra quem se coloca ao encontro d’Ele, quem está pronto” .(1)
Numa atitude de vigilância, como cristãos, precisamos superar todo comodismo, passividade, desleixo, sem nos acomodarmos numa rotina sem brilho e sem luz.
A passagem da primeira Leitura (Is 2,1-5) é um dos oráculos mais profundos e mais belos do Antigo Testamento: trata-se de uma visão em que os povos se encontram no Monte Sião (Jerusalém), em harmonia e paz sem fim.
Somente o encontro com Deus e com Sua Palavra possibilita a harmonia, o progresso, o entendimento entre os povos, traduzido em vida em abundância e paz universal.
Monte Sião é o contrário de Babel, pois esta segunda se caracteriza pelo confronto dos homens com Deus, o orgulho, a autossuficiência, o conflito, a confusão, a falta de entendimento, a dispersão e tudo que destrói a paz e relação de amizade com Deus.
Urge que nos ponhamos a caminho, ao encontro de Deus e Sua proposta de vida, amor e paz, e este sonho se realizará perfeitamente e plenamente em Jesus.
Na passagem da segunda Leitura (Rm 13,11-14), o Apóstolo Paulo nos exorta para que despertemos de nosso sono, ou seja, passemos das trevas para a luz. Deixemos de lado todo egoísmo, injustiça, mentira e pecado, e nos empenhemos numa vida marcada pela partilha, justiça, verdade e graça.
Na acolhida e espera do Senhor que vem, contra toda possibilidade de divisão, é preciso, congregados pelo Evangelho, viver na vigilância e no amor mútuo.
Como batizados, esperar o Senhor que vem é o abandono das obras das trevas, para que, como pessoa, família, Igreja e sociedade, vivamos na luz.
Para isto, é preciso que sejamos sempre despertados de nosso sono: na aurora da chegada do Senhor a noite de nossa existência será totalmente iluminada.
Importante lembrar que “Santo Agostinho compara seu estado na vigília da conversão a um sono semidesperto, em que metade de sua vontade, acordada e ao lado de Deus, mandava que a outra metade despertasse e se decidisse.
Sono profundo ou sono semidesperto, não somente o estado de quem está em pecado ou vive esquecido de Deus, mas também a tibieza, a incoerência, a indecisão: um cristianismo ‘implícito’ que seria melhor chamar de cristianismo apagado…
Foram precisamente as últimas palavras de Paulo que acabamos de ouvir que levaram Agostinho a dar o último passo para a conversão. Encontrava-se num jardim em Milão, no ápice daquela luta entre ‘as duas vontades’, quando ouviu uma voz misteriosa que cantava: ‘Pega e lê’.
Pegou a Bíblia e abriu-a, leu as palavras de Paulo que diziam para que se despertasse do sono, e dessa forma encontrou luz e paz no coração, Havia, enfim, tomado sua decisão diante de Deus” (2).
A passagem do Evangelho de São Mateus (Mt 24,37-44), reforça a atitude de vigilância na fé que o cristão deve ter, em compromisso irrenunciável e inadiável com o Reino.
A vinda do Senhor é certa, é preciso estar vigilante, preparado e ativo, e isto implica em abertura e disponibilidade para o Reino de Deus, eterno e universal, marcado por relações de verdade, vida, graça, justiça, santidade e paz, como tão bem expressa o Prefácio da Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.
Para isto, o Evangelista nos apresenta três quadros: o ócio, o trabalho e a não vigilância, ou seja, a despreocupação com a vida e a existência; ou o contrário, os compromissos e trabalhos para a subsistência; e por fim a ausência da vigilância, que leva à perda do encontro com o Senhor que vem. (v.37-39; 40-41; 43-44, respectivamente).
Somente a atitude de vigilância nos prepara para o verdadeiro Natal: a passagem das trevas para a luz, do pecado para a graça, do distanciamento para a comunhão e intimidade com Deus, do ódio para o amor.
Recuperemos a dimensão Pascal do Natal para celebrar o Nascimento de Jesus, o Sol Nascente, a Luz sem ocaso, que nos veio visitar e sempre vem nos visitar.
Nossa espera é memória e presença. Memória porque Aquele que esperamos, Jesus, já veio (por isto a preparação necessária para o Natal), e presença, porque cremos e sentimos que Jesus está desde agora conosco; presente de modo salutar e real na Santíssima Eucaristia, que não apenas celebramos, mas comungamos, porque é o Deus Conosco, o Deus que Se faz Pão, Comida e Bebida para nos Alimentar e nos Salvar.
Que o Tempo do Advento seja a nossa ida com alegria ao encontro de Alguém que caminha conosco, e mais do que caminhar ao nosso lado, Se faz morada em nós pelo Espírito Santo.
(1) O Verbo se fez carne – (Pe. Raniero Cantalamessa) p. 17.
(2) Idem pp. 18-19

Vigilância ativa na espera do Senhor que vem
A Liturgia do 33º Domingo do Tempo Comum (Ano B) nos convida a olhar o passado e o futuro para viver melhor o hoje de Deus.
É um grande convite à esperança: Deus vai intervir na noite do mundo e mudar a história numa alegre aurora de vida, amor e luz.
Esperar vigilante o Senhor que vem, reconhecendo no presente Sua ação constante, revendo nossa participação na construção do Reino.
A passagem da primeira Leitura (Dn 12,1-3) retrata um difícil momento da História do Povo de Deus (séc. IVa.C), vivido sob a dominação do reinado do selêucida Antíoco IV.
Este rei queria impor a cultura helênica em todo o seu império e praticou uma política de intolerância para a cultura e a religião judaica.
O autor sagrado exorta à constância e a fidelidade, certo que isto assegurará a recompensa divina em sua maior expressão: a vida eterna.
É preciso manter firme a fé sem ceder à imposição de culturas que violem a tradição e a fé judaica.
A preocupação do autor é restaurar a esperança num tempo marcado pela perseguição. A fidelidade a Javé deve ser vivida apesar de toda dificuldade, incompreensão, intolerância e perseguição. Javé recompensará quem se mantiver fiel à Lei e aos Seus Mandamentos.
Esboçam-se os primeiros fundamentos teológicos da Ressurreição: não somos condenados ao fracasso; a fidelidade vivida garante a Ressurreição, a recompensa da vida eterna para o justo.
A mensagem, portanto, é de esperança: a vitória será daqueles que se mantiverem fiéis às propostas de Deus; que não sucumbirem aos valores efêmeros, mas pautarem a existência pelos valores eternos.
Em meio às dificuldades, o cristão não é um “profeta da desgraça”. A certeza da presença de Deus no seu caminhar traz em si a convicção de que a vitória final será de Deus e de todos os que permanecerem fiéis.
Não faz sentido que o cristão seja um profeta da desgraça, com um olhar derrotado para a história e o mundo, curtindo dentro de si o azedume e o pessimismo. Ao contrário, deve ser uma pessoa alegre e confiante, pois olha para o mundo com serenidade e esperança, sabendo que Deus guia a história da humanidade e cuida de cada um com intenso Amor.
Como será diferente o mundo se cultivarmos este olhar!
– Como vemos o mundo e os desafios que nos cercam?
– Por vezes também não podemos ser “profetas da desgraça”, pessimistas, sem esperança de que o mundo possa ser mudado, que a violência seja banida, que a exclusão seja superada?
A passagem da segunda Leitura (Hb 10,11-14.18) é dirigida a uma comunidade em que há a perda do entusiasmo; um povo cansado, fragilizado e sem esperança.
É uma exortação para que se viva uma fé mais coerente e mais empenhada tendo Jesus Cristo como o Sumo e Eterno Sacerdote, que fez de Sua vida uma oferenda, sacrifício uma vez por todas, para que o mesmo façamos, dando a nossa vida em contínuo sacrifício de louvor, entrega e amor.
O autor tem um objetivo explícito: despertar no coração dos crentes uma resposta mais decidida e forte ao Amor de Deus revelado por Jesus que nos amou com Amor sem limites.
Ele é o Servo fiel, vida doada, sacrificada com amor e por amor a nós. Assim, o cristão está inserido na dinâmica do amor que Jesus testemunhou, fazendo da vida um dom de amor, não desanimar, lutando sempre.
O caminho percorrido por Jesus é o caminho do cristão, certos de que a última palavra é sempre a Palavra de Deus, que nos quer salvar e nunca nos abandona, pois é próprio do Amor de Deus nunca desistir de nós para que sejamos melhores. Ele venceu a morte, e com Ele também podemos vencer.
A passagem do Evangelho (Mc 13,24-32) nos apresenta um discurso escatológico, profético/apocalíptico sobre o fim dos tempos: a espera da vinda gloriosa do Senhor.
Exorta à fidelidade, coragem e vigilância. Apesar das vicissitudes do tempo presente, o cristão deve viver na vigilância ativa e com lucidez, na espera da vinda gloriosa do Filho do Homem.
A passagem é um claro anúncio do Triunfo de Cristo sobre toda e qualquer forma de dominação que se possa viver. É um texto não para incutir desespero na mente e no coração dos discípulos, mas para despertar a confiança e a esperança de um mundo novo que está sempre por vir.
As Palavras de Jesus não são uma bela teoria ou um piedoso desejo, ao contrário garantem que o mundo novo, a vida plena e de felicidade sem fim, irá surgir, e não dispensa nossa vigilância e compromisso, nosso testemunho de fé.
A Palavra de Deus abre a porta à esperança. Deus não abandona a humanidade e quer transformar o mundo velho do egoísmo e do pecado num mundo novo de vida e de felicidade para todos.
A humanidade não caminha tragicamente para o holocausto, para a destruição, para o sem sentido, para o nada.
Com Jesus, ela caminha ao encontro da vida plena, com o desenvolvimento das potencialidades que o Senhor cumulou a todos. Não podemos ser omissos.
A religião assim vivida não será ópio. O cristão não pode deixar-se dominar pelo medo, pessimismo, desespero, discursos negativos, angústias. Cristão não é alguém deprimido, assustado, derrotado, mas alguém que tem fé frutuosa, visão otimista da vida e da história, caminhando alegre e confiante ao encontro do mundo que Deus prometeu:
“Uma interpretação unilateral e injusta das realidades humanas (favorecida, aliás, por certa pregação também unilateral e míope) fez com que muitos homens de nosso tempo encarassem com desconfiança a religião cristã, como se fosse inimiga do mundo, da vida, do progresso, do esforço humano; uma religião de evasão, de descomprometimento, de renúncia passiva e covarde; o ópio que entorpece o homem e dele retira todo interesse pela cidade terrestre, seduzindo-o com a promessa de um além feliz e ilusório” (Missal Dominical – p.1076).
Vigilantes, não podemos cruzar nossos braços na espera que um mundo novo caia do céu, mas, com palavras e gestos, é preciso por-se a caminho, cada um dando o melhor de si para a construção do Projeto de vida que Deus tem para nós.
Não há possibilidade que o cristão se feche em seu canto ou mesmo ignore a intervenção e ação divina, com seus apelos e Projetos.
O cristão precisa ficar atento às necessidades, e procurar a resposta com sabedoria, exatamente como Deus assim espera de cada um de nós e de todos nós.
Enquanto Ele não vem, intensificamos nosso empenho, renovamos a alegria e o entusiasmo da fé com engajamento mais frutuoso.
Ser no mundo o que a alma é para o corpo, como nos dizem os primeiros ensinamentos da Igreja: testemunhar com confiança, esperança vivendo a solidariedade, fidelidade, pois não há melhor modo de ficar vigilante esperando a vinda gloriosa do Senhor.
Somente colaboraremos para humanizar o mundo e as relações entre as pessoas, vivendo a partilha, serviço, perdão, amor, fraternidade, solidariedade e paz.
Fortalecendo os vínculos fraternos como Profetas da esperança de um novo dia, mas sem nos alienarmos do compromisso no tempo presente, de modo que a religião não se traduza numa fuga dos desafios, mas enfrentamento e superação dos mesmos. A fé exige combate, inevitavelmente.
O cristão é um peregrino longe do Senhor, e vivendo na penumbra da fé, vai discernindo os valores que são válidos e os não válidos; o que é atual ou apenas um modismo; o que é eterno e o que é efêmero, transitório.
Caminha acreditando que, de fato, romperá na escuridão do mundo a aurora de um mundo novo, vive a transitoriedade do tempo rumo à eternidade.
Vive também o limite do transitório para abraçar a eternidade, pois a transitoriedade e a eternidade são elementos constitutivos de nossa existência.
Da Mesa da Palavra vem a Palavra do próprio Deus, que é para nós, luz e força nas perseguições, dificuldades; segurança para que não nos entreguemos ao desespero e nem mergulhemos nos mares das dúvidas que a história oferece.
Da Mesa da Eucaristia nos vem o Alimento salutar, para que revigorados sejamos testemunhas d’Aquele que veio, vem e virá.
Agora é o nosso tempo da vigilância ativa,
com lucidez, coragem e sabedoria,
renovada e revigorada nas Sagradas Mesas
da Palavra e da Santa Eucaristia.
Quanto mais próximos do Altar, maior será a exigência de Deus para conosco!
O trecho da “Carta a Proba”, do Bispo Santo Agostinho (Séc. V) nos fala sobre a autêntica Oração, na qual exercitamos a nossa vontade.
“Por que nos dispersamos entre muitas coisas e, temendo rezar de modo pouco conveniente, indagamos o que pedir, em vez de dizer com o Salmo:
Uma só coisa pedi ao Senhor, a ela busco: habitar na casa do Senhor todos os dias de minha vida, para contemplar as delícias do Senhor e visitar Seu Templo? (Sl 26,4).
Pois ali os dias não vêm e vão, o fim de um não é o princípio de outro. Todos ao mesmo tempo não têm fim, ali onde nem a própria vida, a que pertencem estes dias, tem fim.
Para alcançarmos esta vida feliz, a verdadeira Vida nos ensinou a orar. Não com multiplicidade de palavras, como se quanto mais loquazes fôssemos, mais nos atenderia.
Mas rogamos Àquele que conhece, conforme Suas mesmas Palavras, aquilo que nos é necessário, antes mesmo de lhe pedirmos (cf. Mt 6,7-8).
Pode alguém estranhar por que motivo assim dispôs quem já de antemão conhece nossa necessidade. Temos de entender que o intuito de nosso Senhor e Deus não é ser informado sobre nossa vontade, que não pode ignorar.
Mas despertar pelas Orações nosso desejo, o que nos tornará capazes de conter aquilo que se prepara para nos dar. Isso é imensamente grande, mas nós somos pequenos e estreitos demais para recebê-lo.
Por isto, nos é dito: Dilatai-vos; não aceiteis levar o jugo com os infiéis (2Cor 6,13-14).
Isso é tão imensamente grande que os olhos não o viram, porque não é cor; nem os ouvidos ouviram, porque não é som; nem subiu ao coração do homem (cf. 1Cor 2,9), já que o coração do homem deve subir para lá.
Isso nós o recebemos com tanto maior capacidade quanto mais fielmente cremos, com mais firmeza esperamos, mais ardentemente desejamos.
Por conseguinte, nesta fé, esperança e caridade, sempre oramos pelo desejo incessante. Contudo, em certas horas e tempos também rezamos a Deus com palavras, para nos exortar a nós mesmos, mediante seus símbolos, e avaliar nosso progresso neste desejo e a nos estimular com maior veemência a aumentá-lo.
Pois tanto mais digno resultará o efeito, quanto mais fervoroso preceder o afeto.
É também por isso que diz o Apóstolo: Orai sem cessar! (1Ts 5,17). O que isso pode significar a não ser: desejai sem cessar a vida feliz, a eterna, e nenhuma outra, recebida d’Aquele que é o único que a pode dar?”
A Oração nos coloca no caminho da busca de uma vida plena e feliz até o encontro definitivo com Deus, na glória da eternidade.
A Oração sem a luta, sem os compromissos concretos é uma fuga. A labuta quotidiana sem a Oração é desespero, inapelavelmente.
A prática da autêntica Oração não se limitará em tão apenas a repetição de fórmulas prontas, em lugares ou tempo especiais, exclusivos; falaremos com Deus com nossas próprias palavras, num diálogo sincero e aberto, expressando nossas alegrias e tristezas, angústias e esperanças.
Pediremos, agradeceremos, louvaremos e renovaremos nossas forças para a ação, para as indispensáveis obras. A Oração assim nos impele para o bem fazer, sem jamais nos omitirmos, sem jamais adiarmos sagrados compromissos.
A Deus nos dirigiremos em todo e qualquer lugar, e em todo tempo, sem reduzirmos nossa Oração à recitação de fórmulas, em tempos e espaços limitados.
O encontro com o Amado leva-nos à contemplação; de modo que se dilata o nosso coração e entramos em outra dimensão de diálogo, espaço e tempo.
Participando desta Escola da Oração de tantos Santos, continuemos nosso aprendizado e oração bem feita para fazermos progressos maiores na vida espiritual, para que vivamos a graça da missão de discípulos missionários do Senhor mais comprometidos com a causa do Reino.

Com a Liturgia do 28º Domingo do Tempo Comum (ano C), refletimos sobre o Projeto de Salvação que Deus tem para toda a humanidade, e ao mesmo tempo, um convite para acolhê-lo com amor e gratidão, embora não merecedores sejamos.
A misericórdia de Deus não exclui ninguém do Seu Projeto, e Ele está sempre pronto a acolher, curar e perdoar, para que assim, com Ele, possamos manter uma relação de amor, fidelidade e gratidão, numa fé solidificada, que cumulará graça sobre graça.
Na passagem da primeira leitura (2 Rs 5,14-17), temos a cura de um leproso, o sírio Naamã. A mensagem desta cura: a vida e a salvação de Deus destinam-se a todos os povos, sem exceção, e uma vez alcançada, deve ser acompanhada de gratidão à fonte da cura e salvação: Deus, e não baal (ídolo).
A passagem é um convite para que os israelitas redescobrissem os fundamentos de sua fé, abandonando toda possibilidade de idolatria, numa confiança exclusiva em Deus, Autor da criação e da vida.
É uma catequese sobre Deus: Deus é o Deus da vida; único, salva a todos, espera a gratidão de suas criaturas e, por fim, não se deixa manipular por nenhuma pessoa, ou qualquer outro poder.
Também, trata-se de um convite a colocarmos nossa esperança de vida plena tão somente em Deus, e não nos ídolos (falsos deuses), que possam nos seduzir.
A passagem da segunda Leitura (2Tm 2,8-13) tem como mensagem a nossa identificação com Jesus Cristo, dando substancial matiz à nossa vida cristã, marcada pela fidelidade, doação, amor e entrega, em confiança inabalável em Deus, em todas as circunstâncias, favoráveis ou adversas.
Urge que perseveremos na fé; mantenhamos fidelidade à doutrina da fé que abraçamos e na pertença à comunidade, uma vida marcada pela total dedicação e serviço à causa da evangelização, do anúncio e testemunho do Evangelho.
Na passagem do Evangelho (Lc 17,11-19), temos a cura de dez leprosos e somente um que foi curado, volta para agradecer a Jesus pela cura alcançada.
Interessante notar que a cura se deu quando estavam a caminho; de modo que também a nossa cura se dá quando não nos instalamos, acomodamos, mas quando nos colocamos sempre no caminho, em total fidelidade e comunhão com o Senhor e Seu Projeto de vida e salvação.
Trata-se de mais um aprendizado para os discípulos que estão caminhando com Jesus, rumo a Jerusalém, onde culminará a Sua missão, passando pela paixão, morte e Ressurreição: a salvação (cura) é dom de Deus, e deve ser acompanhada sempre de nossa gratidão. É preciso uma resposta de gratidão e de adesão à Salvação que Deus tem a nos oferecer.
Este acontecimento é narrado exclusivamente no terceiro Evangelho (Lucas) e tem como objetivo a apresentação de Jesus, como o Deus que Se fez um de nós, exceto no pecado, trazendo-nos a salvação e libertação, com Palavras e gestos concretos, tendo como privilegiados destinatários os empobrecidos, excluídos e marginalizados.
Com a passagem, contemplamos um Deus que dá a graça a todos, e nós haveremos de dar graças a Deus pelo dom de Seu amor em nosso favor, Sua misericórdia que jamais nos abandona.
Envolvidos pela ternura e amor divinos, vida plena e feliz teremos. De todos os males que nos marginalizam, nos atemorizam e nos fazem sofrer, seremos libertos; em nossas fragilidades seremos fortalecidos e, nossos escuros caminhos, pela Luz da Sua Sagrada Palavra serão iluminados, e iluminantes seremos.
Sejamos curados por Deus de nossas enfermidades. Reconheçamos Seu poder e ação libertadora em nossas vidas. Mas também reaprendamos a dizer “obrigado a Deus”, de modo especial na Eucaristia, o momento maior de Ação de Graças, onde expressamos nosso obrigado a Deus, que Se fez nosso Alimento, Comida e Bebida que nos fortalecem, enquanto estamos a caminho da eternidade, e um dia possamos alcançar, com inadiáveis e irrenunciáveis compromissos com a Boa-Nova do Evangelho, como frágeis e desejáveis instrumentos por Deus querido.
Concluindo, digamos:
“Basta-nos a Sua graça, Senhor”. Muito obrigado!