A Palavra do Bispo

Mensagens e publicações do bispo diocesano, Dom Otacilio Ferreira de Lacerda.

O Rico e o Pobre (homilia do 26° Domingo Comum)

A Parábola do rico e do pobre Lázaro

Quem são os “Lázaros” de nosso tempo?

A Liturgia do 26º Domingo do Tempo Comum (ano C) nos convida a refletir sobre nossa relação com os bens: bens que passam e que devem ser usados, e os bens eternos, que devem ser abraçados.

Na primeira Leitura (Am 6, 1a.4-7) Amós, o “Profeta da justiça social”, denuncia a exploração dos ricos sobre os pobres, um luxo vivido à custa da exploração dos pobres.

Sua voz é um grito profético sobre esta situação, e Deus não Se faz indiferente, e não compactua esta, porque não é o Seu Projeto pensado e querido para a humanidade.

O grito de Amós ultrapassa seu tempo e chega até nós, pois também vivemos situações de desigualdade, exploração e miséria que precisam ser superadas: gastos com supérfluos, contrastando com realidades abomináveis de fome, desnutrição, sede e muito mais a ser mencionado.

Na fidelidade a Deus, vivendo a vocação profética, não podemos nos furtar de sagrados compromissos para que todos tenhamos uma vida plena e feliz.

Na segunda Leitura (1 Tm 6,11-16), o Apóstolo Paulo traça o perfil de alguém que serve a Deus, com uma desejável vida santa: deve amar os irmãos, ter fé, ser paciente, perseverante, justo, piedoso, terno, vive totalmente voltado para o outro em doação e serviço; entusiasmado na vivência do ministério; fidelidade na transmissão e vivência da Doutrina que ensina.

Reflitamos:

– Quais das características citadas estão presentes em nós, como discípulos missionários do Senhor?

Na passagem do Evangelho (Lc 16, 19-31), ouvimos a Parábola do rico e do pobre Lázaro, que é uma catequese sobre como devemos possuir os bens e não sermos possuídos por eles, vivendo o amor, a partilha e a solidariedade, sobretudo com os mais pobres, com os “Lázaros” de cada tempo.

Com a Parábola, entre outros ensinamentos, aprendemos que enquanto a Palavra de Deus não for acolhida no mais profundo do coração, a ponto de determinar nossos pensamentos, escolhas e ações, permaneceremos mergulhados na escuridão, encalacrados no egoísmo, no orgulho, na autossuficiência, sem jamais entender e viver a graça do amor e da partilha.

Não podemos perpetuar situações em que um quarto da humanidade fica com oitenta por cento dos recursos disponíveis do planeta, enquanto três quartos ficam com o restante (vinte por cento).

Muito bem nos ensina a Igreja, perita em humanidade: “Deus destinou a terra com tudo o que ela contém par auso de todos os homens e povos; de modo que os bens criados devem chegar equitativamente às mãos de todos…” (Gaudium et Spes n. 69).

O rico da Parábola não tem nome, pois pode ser cada um de nós; representa a humanidade, mas o pobre tem nome, chama-se “Lázaro”, que tem apenas os cães para lhe lamberem a ferida, amenizando a dor, servindo-lhe de companhia na dor da solidão, da marginalização e do abandono.

Que nossos olhos, ouvidos, coração sejam abertos para contemplar a face de Deus e escutar Sua Palavra, para que vivamos o amor, a solidariedade e a partilha com os “Lázaros” de cada tempo.

Os “cães” e os “ais” do Profeta Amós devem ser interpelação constante para todos nós, no amor de compaixão, para a superação de relações pecaminosas de miséria e opressão.

Para tanto, as características dos discípulos mencionadas (segunda leitura) devem estar presentes em nós. Somente assim a eternidade será alcançada.

Reflitamos:

– Como usamos os bens que nos são confiados?

– Sabemos partilhar com os outros os bens que possuímos?

– Quais são nossas riquezas que precisamos colocar em comum em alegre sinal de amor, comunhão, partilha e solidariedade?

– Quem são os “Lázaros” que se encontram em nossas portas?

– O que fazemos concretamente em seu favor?

Continuemos em permanente vigília e conversão, para que nos empenhemos na superação desta brutal e pecaminosa realidade, que se manifesta em inúmeras formas de desigualdade e injustiça social, no bom combate da fé vivido, comprometidos com um novo céu e uma nova terra.

Cremos que, na vivência das Obras de Misericórdia, muito poderemos contribuir na transformação das estruturas sociais injustas.

Obras de Misericórdia Corporais: dar de comer aos famintos, dar de beber aos sedentos, vestir os nus, acolher os peregrinos, dar assistência aos enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos. Obras de Misericórdia Espirituais: aconselhar os indecisos, ensinar os ignorantes, admoestar os pecadores, consolar os aflitos, perdoar as ofensas, suportar com paciência as fraquezas do próximo, rezar a Deus pelos vivos e defuntos.

Dom Otacilio Ferreira de Lacerda – Bispo Diocesano de Guanhães. 

“Enviados para anunciar a Boa Nova”

 

                                    “Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho!”

                                                                          (1Cor 9,16)

É sempre tempo favorável para o aprofundamento da vital missão da Igreja: evangelizar, proclamar a Boa Notícia do Evangelho a todos os povos: 

Todo o poder foi me dado no céu e sobre a terra. Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto Vos ordenei. E, eis que Eu estarei convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28, 18-20).

Como a Igreja nos ensina, a evangelização é tarefa de todos os fiéis, que são chamados, pelo batismo, a ser discípulos missionários de Jesus Cristo.

A missão não é tarefa opcional, mas parte integrante da identidade cristã, não se limitando a um programa ou projeto. É o compartilhar da experiência e do acontecimento do encontro pessoal com Jesus Cristo, por Ele se apaixonando, em corajoso e alegre testemunho a todas as pessoas, tornando visível o Amor misericordioso do Pai, especialmente com os pobres e pecadores. Fiéis à sã doutrina da Igreja, procurando respostas evangélicas para as questões sociais que nos inquietam, a fim de que a vida seja promovida em todos os níveis e em todos os seus momentos, desde a concepção até seu declínio natural, por uma autêntica e sadia cidadania. 

A cidade e seus desafios nos inquietam: superação da miséria, fome, violência, extinção dos escândalos inúmeros (dos quais somos vítimas todos os dias).

É tempo de renovarmos nosso ardor missionário, procurando novas expressões e métodos para que a Boa Notícia do Evangelho chegue a todos os povos e que continuem ressoando em nosso coração as palavras do Apóstolo Paulo: “Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho!”

Enquanto caminhamos na penumbra da fé até a Cidade Celestial, plena de luz, vida, amor e paz, fiquemos vigilantes e em Oração, reavivando sempre a graça do batismo, em alegre anúncio, corajoso testemunho, fazendo da vida amor, doação e serviço, como assim o fez Nosso Senhor, assistidos pela força do Espírito Santo, em total fidelidade ao Plano de Deus e ao Seu Reino.

Dom Otacilio F. Lacerda

Bispo de Guanhães

0 0lhar do Amado…

“Moisés fez, pois, uma serpente de bronze e
colocou-a como sinal sobre uma haste.Quando alguém
era mordido por uma serpente,
e olhando para a serpente de bronze, ficava curado”
(Nm 21,9)

Contemplo os olhares  cheios de confiança,

Olhares suplicantes, silenciosos,
Acompanhados de dor e esperança,
A Misericórdia Divina que não nos ignora.

Contemplo os mesmos olhares no Calvário,
Diante do Corpo mutilado, dilacerado
Da Divina Fonte, agora sem vida,
Pela maldade morto, Coração trespassado…

Contemplo Jesus erguido entre o céu e a terra,
Tendo como causa, incompreendida e última,
A salvação do mundo, a humanidade redimida.
Como suportar dor assim tão grande, na Cruz vivida?

Contemplo o próprio Olhar de Jesus,
Enquanto ainda vida tinha,
Antes de dizer: “tudo está consumado,
Pai, em Tuas mãos entrego meu Espírito”.

Aquele Olhar que se volta para cada um de nós
Em meio à dor, gemidos, prantos incontidos,
Como também incontida Sua manifestação
De Amor e tão grande ternura.

Um pouco antes, de Seus doces lábios
Aquelas palavras que atravessarão séculos,
Milênios, até o fim da humanidade:
“Pai, perdoai-lhes, pois não sabem o que fazem”.

Seu Olhar, enquanto pôde, cruzou amavelmente
Com nossos olhares, ainda que não o tenhamos feito,
Comunicou-nos a riqueza do Seu Amor,
Haverá quem nos ame tanto assim?

Que nosso olhar não se desvie de Seu olhar
Reconhecendo em Sua humanidade lapidada
A divindade, ainda que não possa ser vista,
Ali presente, para nossa humanidade redimida.

Ó Senhor, como não Te contemplar?
Como meu olhar de Ti desviar?
“Se trouxeste o Céu à terra,
E elevaste a terra ao céu”?

Ó Senhor, como não Te amar?
Como Teu Amor não testemunhar?
Quero ser Teu servo indigno, mas com ardor,
E minha vida consumir em chama eterna de amor. Amém!

Dom Otacilio Ferreira de Lacerda

A Cruz e o caminho da santidade     

A Cruz e o caminho da santidade                     

Celebramos dia 14 de setembro a Festa da Exaltação da Santa Cruz, que tem origem desde os primeiros séculos da Igreja, deixemos ressoar em nossos corações parte da bela reflexão sobre a Cruz feita por Santo André de Creta, bispo do século VII.

“ Se não procuras a cruz, Cristo não seria crucificado. Se não houvesse a cruz, a vida não seria pregada ao lenho com cravos. Se a vida não tivesse sido cravada, não brotariam do lado as fontes da imortalidade, o sangue e a água, que lavam o mundo. Não teria sido rasgado  o documento do pecado, não teríamos  sido declarados livres, não teríamos provado da árvore da vida, não teria aberto o paraíso.

Se não houvesse a cruz, a morte não teria sido vencida e não teria sido derrotado inferno… Preciosa também é a cruz porque ela é paixão e vitória de Deus: paixão, pela morte voluntária nesta mesma paixão. É vitória porque o diabo é ferido e com ele a morte é vencida. Assim, rebentadas as prisões dos infernos, a cruz também se tornou a comum salvação de todo mundo”.

Como criaturas amadas de Deus, vocacionados a santidade, a mais bela pretensão da humanidade, reflitamos sobre o  Mistério da cruz.

Somos  pelo Batismo, anunciadores e testemunhas, com a palavra e a vida que este é o melhor caminho a ser trilhado. Que a suntuosidade, sucesso, glória cedam lugar ao despojamento, fragilidade e serviço incansável.

Infelizmente a palavra santidade traz consigo falsos conceitos. Um dos sentidos mais profundos da palavra santidade é a absoluta correspondência à vontade de Deus, numa fidelidade de sua palavra, que ilumina e aponta caminhos novos para quem nela crê, e muitas vezes acompanhada da cruz, não como sinal de derrota mas com gosto de vitória, afinal é este caminho das bem aventuranças que Ele nos apresentou no alto da montanha e que deve ser vivido na planície de nosso  quotidiano.

Santidade como caminho da cruz é a necessária configuração a Cristo Jesus, completando em nossa carne o que falta a sua paixão por amor a Igreja. Ter os seus mesmos sentimentos, testemunhado em nossas pequenas e grandes atitudes ( Cl. 1,24, Fl. 2,1-11).

Na Cruz,  Jesus experimenta a realidade última da condição humana, a miséria da condição humana, o que aparentemente é fraqueza revelada a onipotência do amor de Deus: Loucura para os gregos e escândalo para os judeus.

Na Cruz contemplamos o mistério da presença de Deus Pai, o amante, Deus Filho, o amado e Deus Espírito o Amor que os une.

Contemplar a cruz não é afundar na dor pela dor, mas reconhecer e contemplar o Mistério da Trindade, que por amor, salva o mundo do desamor. Somos sempre convidados subir “ ao Alto da Montanha”, para participar do Mistério Eucaristia e dos demais sacramentos , anunciando a comunidade a Palavra que se fez carne, possibilitando a mesma momentos de profunda intimidade com Aquele que nos chamou.

Mas não é possível ficar o tempo todo na montanha, ainda que seja tentador. É preciso descer a montanha e testemunhar a fé na planície, sobretudo nos novos areópagos ( espaços) , como nos desafiou mais uma vez a Conferência de Aparecida( 2007) .

O mundo das comunicações, a construção da paz, o desenvolvimento e a libertação dos povos, sobretudo das minorias, a promoção da mulher e das crianças, a ecologia e a proteção da natureza, cultura, experimentação científica, a santificação da família e a criação de novas relações em que se superem toda e qualquer forma de exclusão e desigualdade social na fidelidade ao Cristo crucificado, compromisso inadiável com os Crucificados da História!”

O caminho da santidade jamais será uma alienação do mundo e do tempo presente; pelo contrário, é o contato mais íntimo e perfeito com o absoluto revelado na comunhão Trinitária, para que o mundo possa irradiar a luz  que ilumina espaços obscuros sendo sal que dá o gosto de vida, amor e paz. Trilhar este caminho é carregar a Cruz , para que no mundo sejamos de fato, sal e luz ! O mundo precisa de santos ( as) . Eis a proposta de Deus.

A cruz sinal de vitória da vida sobre a morte do amor extremado que superou toda a lógica do ódio.

Na fidelidade a Jesus, partícipes do Mistério de Sua paixão e morte:

A exemplo do profeta Jeremias todos nós tenhamos o coração seduzido pelo  o amor de Deus – O amor fale mais alto em nós.

A exemplo dos salmistas, todos nós tenhamos absoluta confiança em Deus- no Senhor confio e nada temo;

A exemplo do evangelista João todos nós sejamos conduzidos pela verdade maior que nos liberta e nos confere o pleno sentido da vida.

A exemplo do papa Francisco todos tenhamos compromissos com o inadiável rejuvenescimento da Igreja, com ardor ousadia e teimosia.

Oremos:

Nós vos adoramos Senhor Jesus e vos bendizemos, porque pela vossa santa cruz remistes o mundo!

“Se procuras…”

A Cruz, O Crucificado e os exemplos a serem aprendidos!

Na Festa da Santa Cruz, a ser celebrada dia 14 de setembro, sejamos enriquecidos pela Conferência de Santo Tomás de Aquino, Presbítero e Doutor da Igreja no século  XII.

“Que necessidade havia para que o Filho de Deus sofresse por nós? Uma necessidade grande e, por assim dizer, dupla: Para ser remédio contra o pecado e para exemplo do que devemos praticar.

Foi em primeiro lugar um remédio, porque na Paixão de Cristo encontramos remédio contra todos os males que nos sobrevêm por causa de nossos pecados. Mas não é menor a utilidade em relação ao exemplo.

Ne verdade a Paixão  de Cristo é suficiente para orientar nossa vida inteira. Quem quiser viver na perfeição, nada mais tem a fazer do que desprezar aquilo que Cristo desprezou na Cruz e desejar o que Ele desejou na Cruz, pois, não falta nenhum exemplo de virtude. Se procuras um exemplo de caridade:

Ninguém tem amor maior do que Aquele que dá Sua vida pelos amigos (Jo 15,13). Assim fez Cristo na Cruz. E se Ele deu Sua vida por nós, não devemos considerar penoso qualquer mal que tenhamos de sofrer por causa d’Ele.

Se procuras um exemplo de paciência, encontras na Cruz o mais excelente! Podemos reconhecer uma grande paciência em duas circunstâncias: Quando alguém suporta com serenidade grandes sofrimentos, ou quando pode evitar os sofrimentos e não os evita.

Ora, Cristo suportou na cruz grandes sofrimentos e com grande serenidade porque atormentado, não ameaçava ( 1Pd 2, 23); foi levado como ovelha ao matadouro e não abriu a boca ( cf., ls 53, 7; At 8, 32)  É grande, portanto, aparência de Cristo na cruz.

Corramos com paciência ao combate que nos é proposto, com os olhos fixos em Jesus, que em nós começa e completa a obra da fé. Em vista da alegria que lhe foi proposta, suportou a cruz; não se importando com a infâmia( Hb 12, 1-2).

Se procuras um exemplo de humildade contempla o crucificado: Deus quis ser julgado sob Pôncio Pilatos e morrer.

Se procuras um exemplo de obediência, segue aquele que se fez obediente ao Pai até a morte:

Como pela desobediência de um só homem , de Adão, a humanidade toda foi estabelecida numa condição de pecado, assim também pela obediência de um só, toda a humanidade passará para uma situação de justiça( cf. Rm 5,19)

Se procuras um exemplo de desprezo pelas coisas da Terra segue aquele que é  Rei dos reis e Senhor dos senhores, no qual estão encerrados todos os tesouros da Sabedoria e da Ciência( cf. Cl 2,3) e que na cruz está despojado de suas vestes escarnecido, cuspido, espancado, coroado de espinhos e, por fim, tendo vinagre e fel para matar a sede.

Não te preocupes com as vestes e riquezas, porque repartiram entre si as minhas vestes ( Jo 19, 24); nem com honras porque fui ultrajado e flagelado , nem com a dignidade porque tecendo uma coroa de espinho, puseram-na em minha cabeça ( cf. Mc 15,17); nem com os prazeres porque em minha sede ofereceram-me vinagre ( Sl 68,22);

A contemplação da cruz e do crucificado por si mesma nada adianta pois esta procura precisa configurar nossa vida, levando-nos a rever nossas atitudes e pensamentos transformando a nossa vida.

Para Sto Tomás, na Cruz, contemplando o crucificado, não nos falta nenhum exemplo de virtude. Dentre as quais ele destaca:

Caridade, paciência, humildade, obediência e o desprezo pelas coisas da Terra sinônimo de absoluto despojamento.

Contemplando a cruz encontramos o que tanto procuramos ou no mínimo o que tanto deveríamos desejar e viver, como se disse acima.

Há procuras insólitas e extenuantes; procuras que consistem em pedras sem retornos. Santo Tomás nos aponta verdadeiras e salutares procuras.

O que de melhor possamos desejar e procurar encontraremos na cruz e no crucificado;

Amor, ternura, bondade, perdão, carinho, solidariedade, mansidão, acolhida;  sabedoria com traços e aparência de loucura, onipotência na aparência da fragilidade; bondade suprema para além de toda maldade extrema!

“ Se procuras…”  E como procuramos!

E, às vezes, como procuramos mal, quer pelo seu conteúdo, quer pelo seu lugar.

                     Eis o caminho que tanto procuramos: a cruz. Inevitavelmente a cruz. A cruz redentora, cruz salvadora, pois, do crucificado ao mundo foram abertas as entranhas de misericórdia, de fidelidade, de eternidade…

Quem por Ele procurar, será encontrado,

Quem por Ele chamar não será decepcionado:

“ Batei e vos será aberto, pedi e vos será concedido”.

Coloquemo-nos em atitude de verdadeira e santa procura, carregando nossa cruz de cada dia, com as renúncias que se fizeram necessárias.

                                                                              Dom Otacilio F. Lacerda.

Homilia do 24º Domingo do Tempo Comum – ano C

“Entremos na Alegria do Pai”

Com a Liturgia do 24º Domingo do Tempo Comum (Ano C), somos convidados a contemplar a face misericordiosa de Deus, que se revela num Amor infinito e incondicional pela humanidade, de modo especial pelos pecadores e excluídos.

A primeira Leitura (Ex 32,7-11.13-14) retrata um momento fundamental na História do Povo de Deus. Moisés está no Monte Sinai, e lá Deus Se manifesta com Ele dialoga, mais ainda, ora e intercede pelo povo que, infringindo os termos da Aliança, faz um bezerro de ouro para ser adorado.

A mensagem fundamental é o retratar do compromisso de amor e comunhão de Israel com Deus, sem o que cairá em nova escravidão, da qual Javé os libertou. Sem fidelidade e adoração a Javé não há vida, liberdade e felicidade.

Ressalta-se a intercessão de Moisés e a ação misericordiosa de Deus, que se expressa em ternura e bondade. O Amor infinito de Deus pelo Seu Povo sempre fala mais alto que Sua vontade de castigar por causa dos desvios e infidelidades cometidas. A lealdade e o infinito Amor de Deus são notáveis e incontestáveis.

A atitude de Moisés é questionadora: face à indignação de Deus, intercede pelo Povo e não deixa que a ambição pessoal se sobreponha ao interesse do Povo – “deixa que a minha indignação se inflame contra eles e os destrua; de ti farei uma grande nação”. Moisés não aceitou a proposta, mas intercede em favor do povo. Moisés nada pede para si e questiona a tantos que sacrificam tudo pelo status, poder e acúmulo de bens…

Questionemo-nos:

– Quais são as infidelidades que cometemos contra Deus?

– Como corresponder melhor ao infinito e incondicional Amor de Deus por nós?

– Quais lições temos a aprender com Moisés nesta passagem bíblica?

A segunda Leitura é uma passagem da Carta de Paulo a Timóteo (1 Tm 1,12-17) que retrata o ministério do Apóstolo e os efeitos da misericórdia de Deus em sua vida.

A Carta aborda três temas:

– A organização da comunidade;

– Como viver a fé e combater as heresias;

– A vida cristã dos fiéis.

O Apóstolo vê seu ministério como ação da misericórdia e da magnanimidade divinas. Com isto, somos convidados a tomar consciência do Amor que Deus a todos oferece, sem exceção, sejam quais forem as faltas cometidas. É este Deus misericordioso que Paulo conheceu e testemunhou, e que também devemos conhecer e testemunhar.

Como o Apóstolo, viver a gratidão para com o Amor de Deus, que é irrestrito e incondicional, e questionar qual o amor que vivemos para com Deus e para com o nosso próximo.

A passagem do Evangelho (Lc 15, 1-32) é apresentada no contexto do caminho de Jerusalém, onde Jesus consumará a Sua missão, Paixão, morte e Ressurreição.

As três Parábolas comunicam ao Amor de Deus derramado sobre os pecadores, sendo a segunda e terceira exclusivas do Evangelista Lucas, e não por acaso, o Evangelho de Lucas é chamado de “Evangelho da ternura divina”, como bem cita o Missal Dominical:

“Lucas, o evangelista da ternura divina multiplica as narrativas que mostram Jesus em busca dos mais abandonados, dos pobres, dos pecadores, realçando assim o próprio fundamento da nossa religião, que é a atitude dos que são arrebatados pelo abismo do Amor de Deus”. (1)

As Parábolas são apresentadas num contexto muito concreto, em que Jesus é questionado pelos fariseus e escribas pelo fato de andar e comer com os pecadores.

Elas revelam a misericórdia divina, que tem uma lógica diferenciada dos fariseus e escribas (lógica da intolerância e exclusão), pois a misericórdia divina faz novas as criaturas.

Normalmente, são conhecidas como Parábolas da “ovelha perdida”, “moeda perdida” e “filho pródigo”, mas poderiam ser apresentadas de outra forma: a misericórdia e alegria de Deus pelos pecadores que se convertem.

Deus jamais rejeita e marginaliza, ama-nos com Amor de Pai, e esta há de ser a atitude dos discípulos para com os pecadores: amor que vai ao encontro, acolhe e perdoa:

“Não existe verdadeira experiência humana sem intercâmbio, diálogo, confidência, verdadeiro amor recíproco. Só o amor é capaz de transformar, mas com uma condição: que seja gratuito e livre” (2)

Um amor que reintegra e celebra com alegria a volta daquele que estava perdido, morto, e encontrado voltou a viver.

As Parábolas expressam a ação divina que abomina o pecado, mas ama o pecador. A comunidade é chamada a ser testemunha da misericórdia divina e jamais compactuar com o pecado.

Amar como Deus ama, um amor incompreendido e que nos dá vertigem.

Os seguidores de Jesus, que se põem a caminho com Ele, farão sempre uma caminhada de penitência e conversão, sem recriminar e excluir, mas acolhendo os pequenos, pecadores, e também se deixando ser acolhido pelo Amor de Deus.

Amados, acolhidos e perdoados por Deus tornamo-nos acolhedores e sinais do Seu Amor e do Seu perdão, que recria e faz novas todas as coisas. Verdadeiramente, a misericórdia divina vivida nos faz novas criaturas.

As Parábolas revelam que o Amor divino vai até o fim. Como não transbordar de alegria diante deste Amor que nos ama e nos ama até o fim?

Entremos na alegria de Deus, revelada a nós por Jesus, acolhendo e nos deixando conduzir pela ação do Espírito Santo.

Redimidos pelo Amor Trinitário, preenchidos deste Amor, seremos dele comunicadores, transbordando o mesmo Amor para com o outro, na alegria do perdão dado e recebido.

Reflitamos:

– Sinto este Amor incondicional, irrestrito e eterno de Deus?

– De que modo rejeitar o pecado e não o pecador?

– O que as Parábolas da misericórdia divina nos ensinam?

– Como vivemos a fidelidade e correspondência ao Amor divino?

– Entramos na alegria de Deus, na festa dos reconciliados, dos que estavam perdidos e foram encontrados, dos que estavam mortos e voltaram a viver?

– Em que nos assemelhamos aos fariseus e escribas e sua lógica de recriminação e exclusão?

– Sentimo-nos acolhidos, amados e perdoados por Deus?

– Somos instrumentos de acolhida, amor e perdão divinos?

Finalizando, “Cristo nos revelou um Deus como desejamos. Um Deus que é Amor e misericórdia.“ (3)

(1) (2) (3) – Missal Dominical pág. 1236.

+ Otacilio Ferreira de Lacerda,

Bispo Diocesano de Guanhães. 

Homilia do 23º Domingo Comum – Dom Otacilio

Amor e ardor na fidelidade ao Senhor! (Homilia 23º Domingo Tempo Comum – ano C)

A Liturgia do 23º Domingo do Tempo Comum (ano C) nos convida a refletir sobre as exigências para seguir Jesus.

Constatamos que não se trata de um caminho marcado por facilidades. Ao contrário, o caminho da Cruz exige renúncia, coragem, desapegos, desprendimentos como veremos à luz da passagem do Evangelho de Lucas (Lc 14,25-33).

Caminhemos com o Senhor rumo a Jerusalém. Seguir o Senhor, não é falta de opção, ao contrário, é a melhor e a mais decisiva opção que fazemos em nossa vida.

Trata-se da mais radical, pois deve ser feita na raiz de nosso coração, na raiz de nossa vida, de modo que nossa vida é redimensionada e deverá ser pautada pela Sabedoria Divina que nos é revelada, de modo especial na Sagrada Escritura.

Esta escolha implica fortalecimento do coração com o Amor Divino, e a nossa mente com sua mais bela e desejada Sabedoria (Sab. 9,13-18).

O amor é essencial para que se fortifique novo modo de se relacionar rompendo barreiras, superando preconceitos, numa relação de irmãos e irmãs em Cristo como nos fala o Apóstolo à Filemon ( Fm 9b-10.12-17).

A Sabedoria Divina possibilita-nos o conhecimento da vontade de Deus, acompanha-nos em nossos discernimentos para viver a Sua vontade com paciência, constância e prudência.

Assim conclui-se que só por amor e com Sabedoria Divina trilharemos o caminho da cruz que, por mais paradoxal que possa parecer, é o caminho da felicidade.

Neste caminho três exigências para que sejamos cristãos, de fato:

  •   O desapego afetivo em relação à família e até a própria vida;
  • A disponibilidade para carregar a cruz, na mais perfeita e completa imitação do Sublime Mestre e Divino Salvador;
  • A renúncia de tudo, deixando absoluto espaço para Aquele que é o Absoluto em nossa vida.

Deste modo, compreenderemos e veremos confirmada a Palavra do Senhor: “Quem perder sua vida por causa de mim, ganhá-la-á” (Lc 9,22-25).

Como vemos nas Parábolas do Evangelho, aquele que se coloca a caminho com o Senhor, precisa da “sabedoria do arquiteto” e a “prudência de um rei”, para um seguimento que não seja entusiasmo momentâneo.

Sejamos realistas como o arquiteto e prudentes como o rei evitando ilusões fáceis, não reduzindo o cristianismo apenas ao “cultivo de boa vontade”.

Sábios e criativos, saberemos enfrentar os riscos que o compromisso cristão nos apresenta a cada momento, contando com a Fonte da Sabedoria, a presença do Espírito.

Por isto, concluamos com compromisso de mais tempo dedicado à oração e leitura da Palavra Divina, pedindo ao Senhor, uma vez por Ele amados e seduzidos, que jamais O desapontemos no caminhar da fé.

Tenhamos a maturidade de suportar os riscos de nossa fé cristã, com a certeza de que na fidelidade vivida na construção do Reino, nutridos provisoriamente no Banquete da Vida, um dia no Banquete Eterno a Coroa da Glória nos será alcançada.

Se quisermos seguir Jesus… Por onde iremos?  
Pelo caminho da facilidade ou da felicidade?

O que é necessário para que sigamos o Senhor?

Sem cruz não há fidelidade no seguimento ao Senhor!

Sem despojamento, desprendimento e

renúncia não há discipulado!

Como discípulos missionários do Senhor,

amemos com o Amor do Amado.

Eis a fonte, princípio e meta de um autêntico,

frutuoso e desejado discipulado!

+ Dom Otacilio Ferreira de Lacerda 

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Uma reflexão sobre o ministério e a vida do presbítero, à luz dos parágrafos 191-204, do Documento de Aparecida (2007),...
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