“Ali ergueu as mãos e abençoou-os” (Lc 24,50)
A Solenidade da Ascensão aponta para o fim último de todos nós, a comunhão com Deus, o Céu (ano C).
A ida de Jesus para o Céu, não é a afirmação de Sua partida e ausência, mas é a garantia de Sua eterna presença conosco, até que Ele venha pela segunda vez, como afirmamos na Missa: “Anunciamos Senhor a Vossa morte e proclamamos a Vossa Ressurreição. Vinde, Senhor Jesus”.
Antes, é preciso assumir com coragem, no tempo presente, a missão por Deus a nós confiada: anunciar o Evangelho a todos os povos, empenhados, decididamente, no Projeto de Salvação Divina, superando a passividade alienante, indo para o meio do mundo, como sal, luz e fermento.
Nada falta à Igreja, portadora da plenitude de Cristo, para cumprir esta missão. Portanto, renovemos a nossa alegria em crer que, após um caminho percorrido com amor e doação, desabrocharemos na eternidade, pela comunhão com Deus, assim como foi a vida de Jesus Cristo.
Exultemos de alegria por sermos continuadores da missão que Ele realizou, e a nós confiou, enviando-nos do Pai o Espírito Santo de Deus, o Paráclito, fato que celebraremos com a Festa de Pentecostes.
Urge levar a humanidade a viver a comunhão querida por Deus, a fim de que todos sejamos um em Cristo Jesus.
A passagem da primeira Leitura (At 1,1-11) retrata uma comunidade que vive num contexto de crise, desilusão e frustração. O tempo vai passando e não vê realizar o Projeto Salvador. Quando será, enfim, realizado?
Jesus, depois de ter apresentado ao mundo o Projeto do Reino, entrou na comunhão plena e definitiva do Pai, e este é também o destino daqueles que percorrem o mesmo caminho. Fica, portanto, afastada toda possibilidade de passividade alienante, imobilismo estéril.
São Lucas, autor dos Atos dos Apóstolos, escreve em tons de catequese sólida, substancial, pois a comunidade vivia um contexto de crise (anos 80), e se fazia necessário manter-se firme no testemunho do Ressuscitado, sem jamais vacilar na fé, esmorecer na esperança e tão pouco esfriar na caridade.
Lucas escreve a Teófilo (aqueles que são amados por Deus = amigos de Deus) apresentando o Protagonista maior da Evangelização, que é o Espírito Santo, e conta com a participação e ação dos Apóstolos na construção do Reino, que exige empenho contínuo, e nisto consiste o papel da comunidade formada por aqueles que creem e se afirmam cristãos.
Ele nos apresenta a Ascensão quarenta dias depois da Ressurreição: quarenta é um número simbólico, define o tempo necessário para que um discípulo possa aprender e repetir, com fidelidade e coragem, as lições do Mestre.
A descrição da elevação de Jesus ao céu, assim como a nuvem, os discípulos a olhar para o céu, os homens vestidos de branco têm uma mensagem própria: os discípulos, animados pelo Espírito, devem continuar no mundo a história e obra de Jesus, aguardando a Sua segunda vinda definitiva e gloriosa.
A comunidade não pode ficar “olhando para o alto e de braços cruzados”, precisa seguir o caminho que é o próprio Jesus, com olhar para o futuro, renovando quotidianamente os compromissos com o Projeto de Salvação que Deus tem para a humanidade.
Deste modo, a Ressurreição e a Ascensão de Jesus, nos garantem uma vida vivida na fidelidade ao Projeto do Pai: “Uma vida destinada à glorificação, à comunhão definitiva com Deus. Quem percorre o mesmo ‘caminho’ de Jesus subirá, com Ele, à vida plena”. (1)
Os sinais e palavras têm mensagens próprias:
– A elevação aos céus – trata-se do culminar de uma vida;
– A nuvem – sempre um sinal teofânico (manifestação de Deus);
– Olhar para o céu – acena para a segunda vinda de Cristo, que não devemos esperar de braços cruzados;
– Dois homens vestidos de branco – anunciam o mundo de Deus.
Reflitamos:
– Tenho sido fiel à missão que o Senhor me confiou?
– O que gero com o meu testemunho, nos diversos âmbitos em que vivo?
– Quais são meus compromissos solidários na transformação do mundo?
– Fico a olhar para o céu ou me comprometo com a transformação em todos os níveis?
A passagem da segunda Leitura (Ef 1,17-23) nos apresenta a síntese da teologia paulina, em que o Apóstolo Paulo fala da comunidade como um corpo. Cristo é a cabeça e a Igreja é o corpo.
Trata-se de uma mensagem de confiança e esperança, em que a comunidade é exortada a pôr-se a caminho, numa comunhão sólida, formando um só Corpo, que é a Igreja, cuja cabeça é o próprio Cristo.
A comunidade cristã é um corpo – “o corpo de Cristo” – formado por muitos membros, e que Paulo já havia dito em outras Cartas, mas agora escreve da prisão, e faz parte das “cartas do cativeiro”
Cristo com a cabeça e a comunidade um corpo, juntos, forma-se uma comunidade indissolúvel, da qual Cristo está no centro, e nada falta à Igreja para levar adiante a missão por Ele confiada:
“Dizer que a Igreja é a ‘plenitude’ (‘pleeroma’) de Cristo significa dizer que nela reside a ‘plenitude’, a ‘totalidade’ de Cristo.
Ela é o receptáculo, a habitação, onde Cristo Se torna presente no mundo; é através desse ‘corpo’ onde reside que Cristo continua todos os dias a realizar o Seu Projeto de salvação em favor dos homens. Presente nesse ‘corpo’, Cristo enche o mundo e atrai a Si o universo inteiro, até que o próprio Cristo ‘seja tudo em todos’ (vers. 23)”. (2)
A Igreja é, portanto, a habitação onde Cristo Se torna presente no mundo; Ele enche o mundo e atrai a Si o universo inteiro, até que Ele “seja tudo em todos” (Ef 1, 23).
A Ressurreição/Ascensão/Glorificação de Jesus garantem a nossa própria ressurreição/glorificação, por isto é preciso avançar no caminho superando as dificuldades.
Na passagem do Evangelho (Lc 24,46-53), encontramos a descrição do encontro final de Jesus com Seus discípulos, perto de Betânia (Lc 24,50).
Além de reconhecer Jesus como Senhor, a comunidade recebe d’Ele a missão de continuar o Seu Projeto de Libertação da humanidade, no testemunho do Reino por Ele inaugurado.
Jesus voltando para o Pai, e ficando para sempre no meio dos Seus discípulos, confia a eles a continuidade da missão.
Deste modo, com a Ascensão, podemos afirmar que Jesus cumpriu plenamente a Sua missão e reentrou na comunhão do Pai, e assim dá início à nossa missão, sentando-Se à direita do Pai, para reinar sobre tudo e todos, através da missão dos discípulos.
Viver a Boa-Nova anunciada, em confronto com o mundo, pode gerar desilusão, sofrimento e frustração. Mas é exatamente aqui que o discípulo deve dar razão da esperança que possui, testemunhando o Ressuscitado com a força e ação do Espírito Santo Paráclito, o Defensor, o Espírito da Verdade, que estará conosco até o fim dos tempos.
Esta certeza alimenta a nossa coragem, para que testemunhemos o que acreditamos e professamos; o que nos move e nos direciona rumo ao encontro definitivo com Deus, na mais perfeita e plena comunhão de amor, empenhados, por ora, na construção do Reino de amor, vida, alegria, luz e paz.
Deste modo, celebrar a Ascensão de Jesus é tomar consciência:
– da missão que foi confiada aos discípulos e sentir-se responsável pela presença do “Reino” na vida da humanidade;
– de que como Igreja, comunidade dos discípulos de Jesus, somos a presença libertadora e salvadora de Jesus, com a imensa confiança de Deus em nós, testemunhando o Reino de Deus em todos os âmbitos da vida;
– que a missão que Jesus confiou aos discípulos, é uma missão universal: as fronteiras, as raças, a diversidade de culturas, não podem ser obstáculos para a presença de Sua Proposta libertadora no mundo;
– de que é a Festa do Envio, da continuidade da missão que Jesus nos confia –“Ali ergueu as mãos e abençoou-os” (Lc 24,50);
– que não podemos ficar apenas admirando, mas em constante caminho, com renovados compromissos com o Projeto da Salvação;
– da graça do Batismo, inseridos na mais perfeita comunidade de comunhão e amor, a comunidade Trinitária: Pai, filho e Espírito Santo.
Reflitamos:
– Tenho consciência da universalidade da missão?
– Como discípulo, procuro aprender, assimilar e viver os ensinamentos de Jesus para que a missão tenha crédito e seja uma luz para o mundo?
– A vida dos discípulos não está livre da desilusão, sofrimento, frustração… Mas também está presente uma certeza que alimenta a coragem do que cremos: “Eu estarei convosco até o fim dos tempos”. Tenho esta certeza em meu coração?
– No seguimento de Jesus não podemos nos instalar. Ser cristão é ser pessoa do tempo, sem medo de novidades. Estou instalado, acomodado, de braços cruzados, ou fascinado por Cristo e pela missão a nós confiada?
– Procuro a sabedoria e força do Espírito para corresponder à altura?
– Ser cristão é ser alguém que deixou se levar pelo grande sopro do Espírito; é saber que pode contar com Ele na missão.
– Quais são os medos que temos a enfrentar no desempenhar na missão evangelizadora?
– Sentimos a presença do Ressuscitado em nossa missão?
– Temos sentimentos de gratidão pela confiança de Deus em nós depositada para levar adiante a missão?
Concluindo, Celebrar a Solenidade da Ascensão do Senhor é afirmar uma bela verdade de nossa fé, pois a Ascensão do Senhor liga-se necessariamente à Sua Encarnação, e comunica o seu significado autêntico: O Filho de Deus tornou-Se como nós para nos tornar como Ele.
Celebraremos esta presença na Festa de Pentecostes, quando o Espírito Santo nos for derramado, como dom de Amor do Pai, para continuarmos, fiéis na Missão do Cristo, na mais profunda e frutuosa vivência do Amor e da Vida Trinitária.
Como pessoas que creem, deixemos de olhar para o céu, não façamos do cristianismo uma “agência de serviços sociais”, não meçamos esforços para encontrar Cristo, tanto na Palavra como na Eucaristia e nos demais Sacramentos. E assim, renovados, revigorados, nos empenhemos apaixonadamente por Cristo na construção do Reino de Deus, com a força e presença do Espírito Santo.
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